Jaime Spitzcovsky

Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e Pequim.

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Jaime Spitzcovsky

Nos oito anos da era Bill Clinton (1993-2000), o líder palestino Yasser Arafat se transformou num dos mais frequentes interlocutores estrangeiros do governo norte-americano. O presidente democrata surfava na onda global de distensão, impulsionada pelo fim da Guerra Fria, e buscava costurar um acordo de paz no Oriente Médio que, de quebra, ofuscaria reverberações de rumoroso escândalo
sexual na Casa Branca.

A fase derradeira de negociações entrou em colapso em 2000. Na reunião de Camp David, nos EUA, Arafat avaliou como insuficientes as propostas do primeiro-ministro israelense, Ehud Barak. Esvaía-se oportunidade histórica de uma solução negociada, e ciclos de violência, desesperança e pessimismo voltaram a imperar.

Apesar das mesuras oferecidas por Clinton, Arafat optou pelo "maximalismo" da época, a ideia de obter, na totalidade, suas reivindicações. Ignorou o pragmatismo e a possibilidade de avançar, por etapas, na edificação de um Estado palestino.

Na história recente do Oriente Médio, um ás da cartilha pragmática esculpiu marcas indeléveis.

David Ben Gurion, patriarca da independência de Israel, se notabilizou por flexibilizar dogmas, desafiar o senso comum e assumir papel fulcral na viabilização do Estado judeu.

O socialista pragmático, por exemplo, granjeou apoio à resolução de partilha da Palestina, aprovada pela ONU em 1947, que, ao criar dois Estados, um judeu e um árabe, determinava Jerusalém como cidade internacional, ou seja, sem o controle dos futuros países.

Quem conhece um mínimo de Oriente Médio sabe o significado de Jerusalém para a história e cultura judaicas. Mas, naquele momento, a liderança sionista aceitou abrir mão de Jerusalém, ao priorizar o início da viabilização do projeto de soberania nacional. Países árabes rejeitaram a partilha, deslancharam um ataque militar e, ao final do conflito, Jerusalém ficou dividida entre Israel e Jordânia. Com a Guerra dos Seis Dias, em 1967, o controle israelense se estendeu sobre todo o território hierosolimita. Em dezembro, Donald Trump reconheceu Jerusalém como capital de Israel, embora, em seu discurso, não tenha descartado a hipótese de a parte oriental da cidade vir a ser sede do governo palestino, reivindicação central de Mahmoud Abbas, sucessor de Arafat.

Abbas, no entanto, rejeitou a declaração trumpiana. Rechaçou, a priori, negociar o plano de paz esboçado pelos Estados Unidos. Incorre em erro histórico. Falta, novamente, pragmatismo.

A tarefa de Abbas é, sem dúvida, bem mais árdua do que a de seu antecessor. Precisa lidar com Donald  Trump, e não com Bill Clinton. Mas a história ensina a admitir o improvável. Em 1979, por exemplo, foram líderes como o egípcio Anuar Sadat, oriundo do pan-arabismo de Gamal Nasser, e o israelense Menachem Beguin, líder da direita linha-dura, que firmaram um acordo de paz.

Em 1956, Ben Gurion, o pragmático, sentenciou, numa referência a seu país que vale para a região: "Em Israel, para ser realista, você precisa acreditar em milagres".

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