Jairo Marques

Jornalista, especialista em jornalismo social pela PUC-SP. É cadeirante desde a infância.

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Jairo Marques

8 fatos para 'jair' se acostumando

É urgente deixar a angústia e compreender demandas do tempo que chega

O desejo da maioria é soberano e precisa ser respeitado em uma democracia. Tenho falado com meus amigos mais afoitos e mais inconformados que é hora de zelar pela integridade física durante o discurso de enfrentamento, pois quem "ganha" quer a taça e quer dar a volta olímpica no campo livre de seus adversários, apenas com o urro da glória da vitória no peito.

É hora de reconhecer que, pelo que tudo indica, uma força afoita por transformar "tudo o que há" quer o seu espaço de fala e de ações. Aos perdedores, além das batatas amargas, resta confiar nas instituições, entender o novo pensamento e desobedecer com parcimônia. Abaixo, uma pequena relação sobre o que é importante saber desde já:

1) A onda de apoio e valorização da diversidade passa a enfrentar um paredão na esfera pública, com a possibilidade real do fim das políticas de cotas. Na iniciativa privada, porém, o país deve seguir o ritmo internacional de promover comandos multifacetados. Para quem mais depende de assistência ou de um olhar mais atento, é o caso de rezar para nossa senhora da bicicletinha.

2) O colorido, a alegria e os beijos na boca das paradas gays perdem terreno —talvez bem mais do que isso— para os desfiles militares, mais monocromáticos e com promiscuidade mais bem controlada.

3) A poesia acolhedora e acalentadora de Caetano, bem como seus pensamentos sempre evocados a comparecer na mídia e em corações durante tempos tensos do país, cedem lugar ao jeitão mais direto e direito, com expressões mais acaloradas e ensebadas, do pensador Olavo de Carvalho.

4) Aos negros maltratados por brancos na rua caberá pensar duas vezes antes de chamar a polícia. As "minorias" e os ativistas terão de entender onde é o seu lugar, que poderá ser lugar nenhum. Mas nada de violência, apenas em casos de legítima defesa, como a proteção de um para-brisas.

5) A tolerância à corrupção, às benesses políticas, aos gastos exorbitantes da viúva será zero, assim como o acesso às informações públicas e ao próprio mandatário máximo, sobretudo pelos meios "golpistopetista". Quem quiser saber de transparência que vá às redes sociais ou que compre uma boa renda chinesa.

6) A família tradicional volta com tudo, embora o fomento à música sertaneja, sobretudo àquela que fala sobre as dores de corno, seja tema de política pública.

7) Nenhuma novidade em relação ao salário das mulheres. Está tudo certo. Ainda no âmbito feminino, a Amazônia passa a ser chamada de Ana Sônia e estará sujeita a maior penetração por andar provocando motosserras com seu verdinho provocante. E Marielle passa a ser apenas mil placas de rua.

8) Aos sem-terra, aos sem-teto, aos sem vergonha, aos presidiários, aos maconheiros, aos venezuelanos e haitianos restará uma esperança: o país optou por um presidente temente a Deus (e exímio defensor da propriedade privada, da liberação das armas de fogo e do patriotismo).

Lembrando que se acostumar com algo não quer dizer jamais aderir, submeter-se sem desconforto, desistir de um objetivo maior em compasso de espera por novos ares, por novas forças. Acostumar-se é um pouco fingir que o incômodo se acomodou, que a dor latente se amainou.

Mas é urgente deixar a sensação de angústia de lado e ir compreendendo as demandas do tempo que chega. Informação sempre será o antídoto contra a ignorância e o Brasil nunca perderá seu sobrenome de pátria mãe gentil.

jairo.marques@grupofolha.com.br

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