Lygia Maria

Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

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O egocentríssimo deputado

Ao denunciar Felipe Neto por trocadilho, presidente da Câmara mostra que não entende o jogo da democracia

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Para que serve um político? Para criar leis? Fornecer serviços públicos? Pode ser. Mas político serve mesmo para ser zombado. Essa é a sua mais nobre função social, essencial tanto ao cidadão quanto à democracia.

Para o primeiro, é válvula de escape dos tormentos cotidianos: foi assaltado? xingue o governador; preso no engarrafamento? apelide o prefeito; mais imposto a pagar? mande o presidente da República pastar.

Já para o sistema democrático, rir de um político o coloca em seu devido lugar, ajuda lembrá-lo de que ele não está acima da população para a qual deve trabalhar. Tal recurso pedagógico é usado desde a Roma Antiga, quando generais vitoriosos chegavam à Cidade Eterna durante eventos pomposos e eram recebidos por cânticos zombeteiros dos cidadãos. Trata-se do riso como remédio para a vaidade humana.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, durante sessão deliberativa - Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Mas parece que o egocentríssimo, digo excelentíssimo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), discorda. Ele ficou chateado quando o youtuber Felipe Neto o chamou de "excrementíssimo" e, por isso, resolveu denunciá-lo à polícia por injúria.

Alfred Hitchcock, o cineasta, certa vez disse que "o trocadilho é a forma mais elevada de literatura". Pelo visto, o deputado não entende o jogo da democracia do mesmo modo que ignora jogos de linguagem.
Lira pode acionar a Justiça porque não gostou de um chiste sobre sua atuação política? Pode. Deve? Só se pretende ser confundido com um líder narcisista e autoritário.

O imbróglio fica ainda mais engraçado quando sabe-se que Neto apoia o PL das Fake News, que visa de forma atabalhoada regular a liberdade de expressão nas redes sociais. Regular os cidadãos, claro —parlamentares enfiaram um adendo no projeto que os exclui de punição.

Se um deputado já denuncia um mero trocadilho à polícia sem o PL, imagine se este fosse aprovado?
Espera-se que fique a lição: a sociedade precisa defender seu direito de zombar de políticos, e eles devem aceitar que foram colocados no poder para trabalhar e nos fazer rir.

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