Joanna Moura

É publicitária, escritora e produtora de conteúdo. Autora de "E Se Eu Parasse de Comprar? O Ano Que Fiquei Fora da Moda". Escreve sobre moda, consumo consciente e maternidade

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Joanna Moura
Descrição de chapéu Todas

O babado do balonê

A modelagem, que ganhou destaque nos anos 1980, entrou para o rol da má fama da moda

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Semana passada, ao navegar sem rumo pelo feed do Instagram, me deparei com uma postagem de uma conhecida revista feminina. Na chamada lia-se "o balonê voltou. A saia curtinha invadiu o look das fashionistas. Veja 6 jeitos de usar". A frase estava posicionada em cima da foto de uma modelo (magérrima, claro) que ostentava em seu look a referida saia. Na legenda, o reforço da trend que aparentemente "voltou com tudo": "o elemento volumoso retorna diretamente dos anos 2000 para invadir o armário das meninas românticas".

Caso o termo ainda não lhe seja familiar, eu explico: o balonê se refere a roupas que têm um volume arredondado (que pode ser mais ou menos acentuado), com a parte de baixo da costura virada para dentro. O resultado é um efeito "abalonado", como o próprio nome já diz, que se assemelha ao que convencionamos chamar no caso das mangas de "bufantes".

Saia balonê na cor creme sobre uma mesa
O balonê indicam roupas que têm um volume arredondado, com a parte de baixo da costura virada para dentro - Filipe Redondo/Folhapress

A modelagem, que ganhou destaque nos anos 1980, entrou para o rol da má fama da moda e, mesmo tendo tido um novo momento sob o sol no início dos anos 2000, é amplamente reconhecido como de "gosto duvidoso" (entre aspas, porque o termo foi retirado diretamente da uma outra publicação de moda que, recentemente, ecoou a "volta do balonê").

O post me remeteu imediatamente à minha própria experiência com o balonê. Ao contrário, sempre fui atraída por cores, formas ou modelagens que lá pelos idos de 2010 eu adquiri um short balonê de segunda mão. Peça que permanece ativa no meu armário até hoje. E é por conta dessa experiência em primeira pessoa com o balonê que o post fez meus olhos se revirarem. Sou testemunha da estranheza que o balonê gera e lembro perfeitamente dos olhares direcionados ao meu pobre short cujo único pecado foi —literalmente— ser fofo demais.

A verdade é que o post faz pensar que, ao sairmos às rua nas próximas semanas ou meses, podemos nos deparar com uma, duas, três, dez pessoas usando a tal "tendência". Infelizmente, ou felizmente, dificilmente será esse o caso. O artigo tenta inutilmente dar um ar de desejo mainstream àquilo cujo uso pontual e efêmero se restringe apenas a uma "elite" da moda que dita as regras e também lucra com elas.

Nada disso é novidade, desde que o mundo é mundo e a moda é moda, tal qual como a conhecemos, que essa indústria vive de gerar desejos —muitas vezes estapafúrdios— para gerar consumo. Mas com o advento das redes sociais e a entrada de marcas de ultra fast fashion na cena, o ritmo de lançamentos de tendências e se proliferou numa velocidade nunca antes experimentada.

E como nada se cria da noite para o dia, as tais tendências têm abordado temas cada vez mais esdrúxulos. É um tal de tomato girl, normcore, cottage norm, mob wife (sim, até look de mulher de mafioso parece ter virado moda), todos nomes metidos para empacotar atitudes ou gêneros que há muito existem em maior ou menor grau, mas que são colocados sob uma lupa e explodidos para a internet, gerando desejo e, muito provavelmente, frustração.

Me chamem de careta, mas eu gostava mais daquele breve momento há poucos anos quando as tendências vinham das ruas, da inspiração real, e não dos publiposts.

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