Joel Pinheiro da Fonseca

Economista, mestre em filosofia pela USP.

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Joel Pinheiro da Fonseca

São Paulo precisa ser mais densa; a revisão do Plano Diretor ajuda nisso

Texto é avanço e não há contradição com defesa de áreas contra verticalização

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Moro em São Paulo, em um bairro próximo a estações de metrô, pontos de ônibus e grandes avenidas. Se tem uma região que deveria abrigar mais pessoas —que poderão andar mais pelas ruas e utilizar transporte público em vez de depender apenas do carro— é a minha. Áreas com mais infraestrutura urbana devem ter mais densidade. E, graças ao Plano Diretor de 2014, é isso que tem acontecido. Por isso, considero-o um sucesso e defendo a revisão aprovada na Câmara de Vereadores.

Vemos mais prédios, mais gente, mais densidade. E o fato é que São Paulo é uma cidade muito pouco densa. Mesmo nossos bairros mais construídos ficam muito atrás de Paris ou Nova York. Prédios de seis andares em Paris têm coeficiente de aproveitamento maior do que edifícios de 15 andares em São Paulo, porque eles ocupam o lote todo, sem necessidade de deixar espaços vazios ao redor da torre.

Prédios na Lapa, zona oeste de São Paulo
Prédios na Lapa, zona oeste de São Paulo - Alessandro Shinoda - 16.jan.12/Folhapress

A baixa densidade, somada ao uso exclusivo (um imóvel é ou apenas residencial ou apenas comercial), se traduz em percursos maiores pela cidade, distância maior entre trabalho e moradia, e portanto maior uso de automóvel e viagens mais longas para trabalhadores. Críticos que lamentam a verticalização sem propor outras saídas para adensar a cidade estão apenas dando um verniz de preocupação social a uma urbanização excludente e distorcida.

Não que a maior densidade dos bairros centrais irá magicamente e sozinha torná-los acessíveis a todos. O processo é mais complexo.

Demolir algumas casas de R$ 5 milhões para se construir dezenas de apartamentos de R$ 2 milhões permite que pessoas —de renda alta— saiam dos bairros onde moravam até agora e se mudem para esses bairros mais centrais. Com isso, o valor dos imóveis dos bairros de onde eles saem é reduzido, fazendo com que outros que moravam ainda mais afastados se mudem para lá, o que reduz o preço dos imóveis da região em que moravam etc. Ou seja, uma maior oferta de imóveis em regiões centrais aproxima toda a população dessas áreas. A cidade fica mais concentrada.

Uma das melhores mudanças do último Plano Diretor, mantida na revisão, é a retomada do uso misto nas edificações: prédios residenciais com estabelecimentos comerciais no térreo. Vejo restaurantes e lojas ocupando espaços que, antes, seriam um portão de prédio e, portanto, trazendo pedestres a uma calçada que, caso contrário, ficaria vazia. Esse uso misto vem junto de uma flexibilização das regras de recuo. Quarteirões inteiros tomados por muros e cercas com torres isoladas no meio dos terrenos foram um dos maiores erros urbanísticos das últimas décadas, que agora começa a ser corrigido.

As incorporadoras são anjos que pensam no bem da cidade? Deus sabe que não. Mas isso não significa que toda restrição à construção seja bem-vinda. A cidade paliteiro, os bairros de casarões abandonados ou subutilizados, o espraiamento, as grandes distâncias, o meio hostil ao pedestre; são todos consequências de regras muito restritivas —que atendem ao preconceito antimercado de urbanistas e ao privilégio de ricos proprietários que não querem mais gente em seu bairro nobre— implementadas por décadas.

Assim, a revisão do PDE é um avanço, e nisso não há contradição com a defesa de vilas e de alguns quarteirões que resistam à verticalização. Exceções trazem variedade à cidade; só não devem travar a construção em áreas com boa infraestrutura. Em meio a tantos problemas profundos e de longo prazo, já se vê que o escarcéu criado em cima de um aumento do raio em que se pode construir prédios é infundado. Ele estende uma lógica que faz todo o sentido.

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