Jorge Abrahão

Coordenador geral do Instituto Cidades Sustentáveis, organização realizadora da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis.

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Bruno, Dom e o papel das cidades na Amazônia

Tantas Atalaias do Norte no Brasil precisam de um olhar diferenciado, que vise à redução das gritantes desigualdades que nos assolam

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O que mais me impressionou na foto em que Pelado —um dos supostos assassinos de Bruno Pereira e Dom Phillips— era conduzido por policiais federais, foi a imagem dos jovens que, amontoados num barranco, assistiam à cena: vestimentas básicas, descalços, olhos fixos no suposto assassino que tinha a cara coberta por um capuz. O que eles pensavam naquele momento? Que perspectivas têm de futuro? Onde vivem?

Com pouco mais de 15 mil habitantes, Atalaia do Norte carrega o terceiro pior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do Brasil, índice que evidencia sua vulnerabilidade nos temas de educação, saúde e renda, entre outros. É governada por Denis de Paiva, do PSC (Partido Social Cristão), e aliado do governo federal.

O crime que a cidade amazonense observou com pavor é resultado de uma sequência de avanços criminosos sobre a população originária e a floresta. A relação promíscua entre empresas e política é a marca de um país primário que ainda não aprendeu a se defender de grupos privados que só pensam em seus próprios interesses. Essa necessária transição é que marcará o amadurecimento tardio de um país rico culturalmente e em recursos naturais, mas sequestrado pelos interesses de poucos.

Policiais federais levam Pelado, suspeito de assassinar Dom Phillips e Bruno Pereira, observados por moradores de Atalaia do Norte
Policiais federais levam Pelado, suspeito de assassinar Dom Phillips e Bruno Pereira, observados por moradores de Atalaia do Norte - Avener Prado - 15.jun.22/Agência Pública/AFP

O assassinato que chocou o Brasil e o mundo tem como pano de fundo o estímulo do governo federal à criação de um ambiente violento, que desrespeita os povos indígenas e ribeirinhos e favorece políticas de depredação da Amazônia. As ações passam pela impunidade, pelo desmonte dos órgãos de fiscalização, estímulo aos negócios ilegais e a liberdade do crime organizado. Estes casos, que nos remetem a séculos atrás, precisam ser enfrentados com a urgência que sua indignação provoca.

Qual o papel da cidade na construção de um ambiente favorável, que gere perspectiva e oportunidades para sua juventude? Que qualidade de vida ela oferece para sua população? Ela pode tornar-se mais justa, reduzindo a sensação de terra de ninguém, por meio da implementação de políticas públicas que reduzam o espaço para este tipo de ação predatória.

Tantas Atalaias do Norte no Brasil precisam de um olhar diferenciado, que vise à redução das gritantes desigualdades que nos assolam. Mais investimentos devem ser direcionados para as cidades mais vulneráveis, buscando reduzir as diferenças e proporcionar perspectiva de vida digna para a população.

Para tanto, são necessárias políticas públicas que direcionem mais recursos dos governos federal e estadual para estas cidades vulneráveis, além de apoio para que consigam enfrentar seus problemas de maneira integrada. Neste contexto, é uma insanidade a proposta do governo federal de redução do ICMS dos estados, o que acarretará cortes na educação e saúde, aumentando ainda mais a pobreza. A ideia só aprofundará a crise dos estados e municípios, deixando-os ainda mais vulneráveis para o enfrentamento dos desafios atuais e a criação de perspectivas futuras.

Somente com políticas voltadas à inclusão, neste que é o mais desigual dos países em desenvolvimento, os jovens que assistiram à cena terão novas oportunidades e poderão se livrar dos grupos ilegais que os atraem. Este é um dos caminhos para que as cidades sejam espaços de inserção cidadã que conduzirão o país na direção de proporcionar uma vida digna para sua população.

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