A paixão pelo futebol contamina as pessoas, às vezes sem que se perceba, às vezes porque você trabalha para contaminá-las.
Quantas crianças passarão a torcer pelo Galo depois da épica conquista de virada à mineira na Bahia?
Quantas pessoas pelo mundo afora torcem por algum clube por influência dos pais, de um tio, ou de um vizinho?
Meu pai ficou corintiano graças a um vizinho português, seu Antônio, que o levava ao estádio e xingava o juiz assim que o apitador pisava em campo.
"Ladrão! Ladrão!", gritava o lusitano.
"Mas o jogo nem começou", se assustavam os torcedores em volta dele: "É pra sabeire, é pra sabeire", seu Antônio respondia irado.
Sem raiva, o velho deixou-me o Corinthians como herança, naturalmente.
Admito que fui menos democrático e os quatro mosqueteiros que criei adotaram o time, digamos, do avô.
Ter time diferente dos filhos, acredito, muda o vínculo com o futebol, porque vê-los tristes por uma derrota para o meu time não seria gostoso —e vê-los felizes por uma vitória do clube deles, contra o meu, seria ainda pior.
Daí jamais ter dado de presente a camisa do Corinthians a algum recém-nascido filho de amigo. Sempre dei a camisa do time do pai.
Conto tudo isso para explicar o título desta coluna.
Luiza, minha neta de 16 anos, levada por um dos tios (Felipe) a Itaquera pela primeira vez na vitória contra o Athletico, anda enlouquecida pelo Corinthians, a ponto de, na quarta-feira (1º) mandar-me um zap: "Giuliano treinou hoje!".
E continuou: "Título de sua coluna no domingo: A revanche do quarteto fantástico".
Apressada, ela achou que a volta do jogador aos treinos será suficiente para que ele jogue neste domingo (5) contra o Grêmio e já deu como certo que Sylvinho o escalará ao lado de Renato Augusto, Willian e Róger Guedes.
Daí, o quarteto, chamado por ela de "fantástico", vencerá o Grêmio, condenará o time gaúcho ao rebaixamento e, assim, vingará a Fiel da queda acontecida em Porto Alegre, no estádio Olímpico, no empate por 1 a 1, em 2 de dezembro de 2007.
Luiza tinha então quase 3 anos.
A temporada de 2008 se afigurava perigosa, porque seus avós maternos, são-paulinos, moradores na mesma avenida do estádio do Morumbi, a recebiam aos domingos, onde as tardes eram festivas durante a campanha do tricampeonato brasileiro do tricolor.
Aos sábados Luiza ficava comigo e, felizmente, como a Globo precisava de audiência, passou a transmitir os jogos da Série B do alvinegro, nunca aos domingos, sempre aos sábados.
O Corinthians ganhava jogo após jogo e, desnecessário dizer, nunca expliquei a ela a diferença entre a primeira e a segunda divisões.
Assim foi possível ensiná-la a entoar o "aqui tem um bando de louco", desse jeito mesmo, no singular, e ganhar a disputa entre os avós, também porque o pai dela não esmoreceu.
Pois é esta Luiza que hoje quer determinar o título de minha coluna nesta Folha, como se fosse o jornal da escola dela.
E, o que é pior, ou melhor, o avô obedece, mesmo sob o risco de perder o emprego.
Coisas que só o futebol é capaz de fazer.
Mentira!
Coisas que só a avozice explica, algo que quando a rara leitora e o raro leitor souberem o que é entenderão perfeitamente.
Por enquanto, apenas perdoem este avô babão —que não quer a desgraça do Grêmio, apenas ver a Luiza feliz.
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