Juliano Spyer

Antropólogo, autor de "Povo de Deus" (Geração 2020), criador do Observatório Evangélico e sócio da consultoria Nosotros

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Juliano Spyer

Esforço da Flip por inclusão social esbarra no elitismo

Religião é o tema que mais leva brasileiros a entrar em livrarias

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

"Por que os progressistas conseguem aprender línguas indígenas, mas não conseguem falar com evangélicos?," questiona o cientista político Miguel Souza, que é presbiteriano. Ele se refere a eventos culturais como a Flip, que não abrem espaço para autores desse segmento, apesar de os evangélicos lerem mais do que a média dos brasileiros.


O termo "literatura evangélica" pode sugerir que falamos apenas de livros que promovem visões de mundo cristãs. Mas esse rótulo abarca um campo maior. Por exemplo, o escritor Miguel Del Castillo, que é evangélico, registra experiências do evangelicalismo carioca de classe média em seu romance "Cancún". "Fui convidado para a programação principal da Flip em 2019, mas talvez eu seja exceção", ele pondera.

0
O escritor Miguel Del Castillo - Eduardo Anizelli - 11.jul.19/Folhapress


Quando um autor religioso faz sucesso, sua crença é escondida do público. É o caso do pentecostal Carlos Nejar, que é membro da Academia Brasileira de Letras.

É como se a associação da obra com a temática da religião a tornasse algo particular, "nichado", que não interessa ao leitor comum. "Meus livros fazem dialogar história, teologia, filosofia, antropologia e sociologia," conta o historiador e teólogo André Reinke, "mas como o título contém a palavra ‘Bíblia', eles são alocados nas prateleiras de religião".

O preconceito também existe do outro lado. Uma parte dos evangélicos rotula de "pagã" a literatura que não é religiosa. "Posso ter mil formações acadêmicas, mas o que é bíblico é bíblico," defende um pastor pentecostal. "A literatura secular aceita qualquer coisa."

Por causa dessa visão fundamentalista, muitas igrejas proibiram a leitura da série Harry Potter entre seus membros, argumentando se tratar de livros sobre bruxaria.

Outros evangélicos consideram que seu campo ainda está imaturo para atuar nas artes. "Sonho com um Brasil em que cristãos vocacionados para a arte dialoguem com outros artistas e com a sociedade como um todo," diz o jornalista Ricardo Alexandre. "Mas essa ainda é uma realidade distante, porque as igrejas não ensinam a dialogar, ensinam a pregar".


E hoje esse diálogo também não seria bem-vindo. Na semana passada, perguntei aqui: por que evangélicos são excluídos da cena literária do Brasil? Uma leitora reagiu: "A Flip não é nicho para livros provenientes de qualquer corrente religiosa ou crença. A Flip é laica, graças a Deus!".

Esse elitismo é desolador. É um erro comum pensar em laico como sinônimo de ateu. Laico significa que uma religião não é privilegiada em relação às demais. Ainda assim, a leitora aponta para o elefante na sala. Em um país em que a religião é o assunto que mais leva pessoas a entrar em livrarias, não é só o cristianismo evangélico que faz falta em eventos como a Flip, são todas as expressões religiosas.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.