Katia Rubio

Professora da USP, jornalista e psicóloga, é autora de "Atletas Olímpicos Brasileiros"

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Katia Rubio

Só o tempo, e os interesses, dirão se os eSports são esportes

É evidente a especificidade desse campo e aí estão os maiores desafios para o esporte

Atleta de eSports durante partida do game Call of Duty: Black Ops 4
Atleta de eSports durante partida do game Call of Duty: Black Ops 4 - Robert Reiners/AFP

Acompanho com curiosidade os movimentos que transformam os Jogos Olímpicos.

Isso porque em mais de um século de existência, poucas foram as alterações no programa e na política.

Não digo que elas não tenham ocorrido, mas em um período histórico onde tanta coisa aconteceu é difícil imaginar o quão pouco o movimento olímpico mudou e quanto tempo isso demorou.

A começar com a inclusão das mulheres. Impedidas de participar na primeira edição em 1896, porque eram "frágeis dos nervos" guerreiras de todo o mundo, a seu modo e a seu tempo, participaram de uma frente de resistência que dura até o presente. Basta lembrar que a prova feminina dos 800 metros no atletismo foi retirada do programa em 1928 e só retornou em 1960. Sem contar a maratona feminina que foi incluída nos Jogos de Los Angeles de 1984, depois que mulheres correram disfarçadas em provas masculinas. Não posso deixar de citar ainda o salto com vara que só chegou aos Jogos Olímpicos em 2000 e o boxe feminino em 2012.

Atento aos ventos que sopram de diferentes partes do mundo o movimento olímpico parece estar mais sensível aos fatos do presente.

Da maior inclusão das mulheres, passando pelo combate à corrupção até o empoderamento dos atletas, o discurso olímpico sofreu uma alteração radical nos últimos anos. Claro está que o "negócio" olímpico precisa fazer a roda girar. E para que isso aconteça é necessário acompanhar novas tendências e discursos.

Os Jogos da Juventude mostram isso. Usado como um balão de ensaio para testar novas tendências há ali uma demonstração do que se enxerga para o futuro. A inclusão de atividades culturais, aliás, como já foi nos Jogos do passado. O incremento de times mistos. A abertura dos eventos para a cidade e para a sociedade, retirando parte das atividades de estádios e ginásios fechados e alocando-os em espaços públicos.

Sem dúvida isso representa um momento de virada.

Torcida lota um centro de convenções em Las Vegas para um torneio de eSports
Torcida lota um centro de convenções em Las Vegas para um torneio de eSports - Sam Wasson/AFP

As modalidades de aventura e de contato com a natureza também fazem parte desse movimento. A juventude é o público mais desejado do movimento olímpico. Os jovens trazem a irreverência e a ousadia de um tipo de competição desejada, porém, não muito conhecida dessa estrutura secular.

A resistência que envolveu a inclusão do skate e do surfe se volta agora para os esportes eletrônicos.

Considerados por muitos como uma diversão e não uma competição eles estão por toda a parte.

Telefones, tablets, TVs, computadores, ou seja, em todos os equipamentos fundamentais para pessoas que saíram das cavernas.

Estou certa que esse é um tema controverso. Por isso tenho dedicado parte do meu tempo a estudá-lo.

Recentemente participei do 1º Congresso Brasileiro de Esportes Eletrônicos, em Lavras (MG), onde um grupo se dedica a estudar esse fenômeno. Lá pude presenciar a seriedade com que o tema é tratado. É evidente a especificidade desse campo. E aí estão os maiores desafios para o esporte.

Nessa modalidade cai por terra a necessidade de times constituídos por nações, base da estrutura do movimento olímpico.

Não bastasse isso, o poder de estruturação dos jogos e organização de campeonatos não está nas mãos do sistema de federações e confederações, e sim das empresas que os desenvolvem. Isso por si só representa uma revolução no sistema olímpico.

Resta ainda a discussão sobre o eSport ser ou não ser esporte. Como tantas outras modalidades, só o tempo, e os interesses, dirão. O Oriente já mostra os caminhos.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.