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As chaves para abordar a questão global das vacinas

Face à crise do multilateralismo, da Covid-19 e da globalização, quais são as chaves para a disputa sobre as vacinas?

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Magdalena Bas Vilizzio

PhD em relações internacionais pela Universidade Nacional de La Plata (Argentina) e membro do Sistema Nacional de Pesquisadores (Uruguai)

Mónica Nieves

Mónica Nieves é professora na Universidade da República, Uruguai. Mestre em Relações Internacionais pela Universidade da República. Co-responsável pelo Espaço de Relações Internacionais e Interdisciplina.

Com o início da vacinação contra a Covid-19, 2020 terminou projetando o primeiro passo para o fim da pandemia. No entanto, 2021 trouxe novas incertezas e desafios. Partindo da ideia de “uma saúde” em para os seres humanos, animais e o planeta, a propagação do vírus está enraizada desigualdades anteriores que se refletem em sistemas de saúde fracos, informalidade laboral ou acesso à educação, expondo ao mesmo tempo os efeitos das alterações climáticas. Face à crise do multilateralismo, da Covid-19 e da globalização, quais são as chaves para a disputa sobre as vacinas?

Segurança humana

A primeira questão-chave é a segurança humana, embora as medidas coletivas e nacionais nem sempre sejam bem definidas. Enquanto as mortes continuam a aumentar, a apropriação "maciça" de vacinas por certos Estados revela novas formas de desigualdade global.

De acordo com o anuário do Centro de Educação e Investigação para a Paz (CEIPAZ), o médico Fernando Lamata argumenta que os países mais ricos, que representam 14% da população mundial, monopolizaram 84% das vacinas, o que poderia ser classificado como um “apartheid de vacinas”. Além disso, o mecanismo COVAX, criado para a compra e distribuição de vacinas aos países em desenvolvimento, acabou por ser uma “boa ideia que ficou aquém das expectativas”, como aponta a jornalista Ann Danaiya Usher no The Lancet.

O claro-escuro também é visto através da lente da geopolítica com a chamada “diplomacia da vacina”, implementada através de doações de estados desenvolvidos para estados em desenvolvimento, tal como anunciado na última cimeira do G7. Embora essas medidas ajudem a construir o andaime para situações de emergência, são pontuais e parciais e não resolvem o problema subjacente, ao mesmo tempo que aprofundam as relações centro-periferia assimétricas.

Considerando que menos de 25% da população mundial recebeu pelo menos uma dose, as grandes diferenças entre continentes e que cerca de dez bilhões a mais ainda são necessários para alcançar a imunidade do rebanho à escala global, a decisão do G7 de doar mil milhões de doses é insuficiente.

Governação global

A segunda chave é a governança global, tanto a nível da saúde como do comércio, porque a regulação do mercado é fundamental em termos de propriedade intelectual e vacinas. Nesse quadro, algumas ações multilaterais propuseram alternativas auspiciosas. Entre elas, a recente resolução sobre o reforço da preparação e resposta da Organização Mundial de Saúde a emergências sanitárias, que salienta a necessidade de criar normas internacionais para proteger a segurança humana.

Na área do comércio internacional, a Organização Mundial do Comércio (OMC) discutiu a proposta da Índia e da África do Sul sobre a suspensão temporária dos direitos de propriedade intelectual da vacina e de outros produtos e tecnologias relacionados com a Covid-19. A proposta é apoiada por cerca de uma centena de países de rendimento médio e baixo.

Após a rejeição inicial, os Estados Unidos, o Parlamento Europeu, a China e outros Estados estão dispostos a discutir a questão e na última reunião da OMC foi decidido seguir este caminho. Será a governação global eficiente? Será a discussão da questão suficiente? Não, mas as mudanças começam com uma discussão.

A ausência de regras internacionais

A governação global assenta no direito internacional, como um conjunto de regras que são responsáveis pela construção de um espaço público onde as vozes dos mais fracos são ouvidas, como afirma o jurista finlandês Martti Koskenniemi. Por conseguinte, a terceira chave para compreender a questão encontra-se no direito internacional.

Por que é necessária uma discussão jurídica dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio no meio de uma emergência sanitária global? A chave talvez não seja o direito internacional, mas a sua ausência. Não existem normas internacionais para pandemias ou sindicatos – a soma de duas ou mais epidemias – que estabeleçam limites à propriedade intelectual no caso de uma emergência global.

A proposta de um instrumento internacional de preparação para futuras pandemias, patrocinada pela Organização Mundial de Saúde, pelo Presidente do Conselho Europeu e por mais de 30 Chefes de Estado é, portanto, bem-vinda. Isso mostra que, para uma questão global, a resposta deve (e será) necessariamente global. E apesar do fato de o caminho jurídico estar apenas a começançando e de ser essencial reforçar o multilateralismo para lhe dar um caminho, o documento salienta a necessidade de reforçar o direito internacional face às ações individuais.

Outras opções para sair da crise

Agora, perante o peso crescente das empresas transnacionais, existem outras opções para a fabricação de vacinas que se baseiam na colaboração entre os setores público e privado: a chamada “terceira via”. Essas ideias, citadas pela economista Mariana Mazzucato em seu livro “The Entrepreneurial State”, estão próximas do que a AstraZeneca está fazendo hoje.

A capacidade produtiva de alguns países da América Latina e do Caribe – Argentina, Brasil, México, por exemplo – poderia viabilizar alternativas face a um fator premente como o tempo. Sobretudo, levando em conta os prazos da discussão na OMC, bem como os processos de transferência de know-how e logística que serão necessários posteriormente, caso a suspensão temporária seja implementada.

Em suma, três aspectos precisam ser abordados para alcançar a acessibilidade das vacinas: os desafios da proteção da segurança humana, a ausência de normas internacionais e os desafios de uma governança global eficiente. Abordar essas três questões de forma multilateral é a base para a construção de resiliência num mundo cada vez mais desigual e vulnerável.

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