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O Panamá necessita de uma política melhor para sair da crise

Aumento de preços é a ponta do iceberg; são necessárias políticas que abordem as assimetrias sociais

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Jon Subinas

Doutor em sociologia e antropologia pela Universidade Complutense de Madri

No mês de julho, em meio a uma calma tensa na região, no Panamá, um dos lugares menos esperados por sua estabilidade política, irrompeu um potente protesto pelo aumento dos preços dos combustíveis, alimentos e remédios. As mobilizações paralisaram o tráfego em várias partes do país durante vários dias, impedindo o transporte de mercadorias, o que gerou o desabastecimento de vários produtos.

Manifestantes participam de protesto para exigir medidas do governo para conter a inflação e reduzir os preços dos combustíveis e alimentos, na Cidade do Panamá, em 12 de julho de 2022 - Erick Marciscano/Reuters

Um massivo e heterogêneo apoio aos protestos

Apesar do impacto econômico, três em cada quatro pessoas apoiam as mobilizações, segundo uma pesquisa online realizada pelo Centro Internacional de Estudos Políticos e Sociais, AIP do Panamá (Cieps). Este apoio contrasta com os dados do último relatório Latinobarómetro, que afirma que nove em cada dez pessoas nunca participariam de um protesto não autorizado. Esta contradição define o protesto como um acontecimento inesperado e incomum no país.

Os protestos têm sido protagonizados por uma pluralidade de atores como sindicatos e movimentos sociais que incluem médicos, professores, trabalhadores da construção civil, estudantes e grupos indígenas. Embora as reivindicações sejam lideradas pela Aliança Nacional pelos Direitos dos Povos (Anadepo), uma organização que representa 20 grupos de docentes, trabalhadores do campo, pescadores, trabalhadores do transporte e estudantes, outros grupos como a Coordenação Nacional dos Povos Indígenas (COONAPIP) e o Sindicato Único dos Trabalhadores da Construção Civil (Suntracs) também participam.

Estes atores constituem uma rede heterogênea que aglutina diferentes demandas, à maneira da "multidão" descrita por Antonio Negri e Michael Hard. Frente a esta multidão, o governo decidiu abrir várias mesas de diálogo para atender às diferentes demandas em diferentes localizações. No entanto, a estratégia fracassou e o governo teve que abandoná-la.

Após três semanas de protestos, com a mediação da igreja, as partes puderam sentar-se em uma única mesa de diálogo, não sem seus altos e baixos, conflitos e controvérsias, mas tentando restaurar a normalidade política.

As causas dos protestos

O gatilho conjuntural dos protestos foi o aumento dos preços da gasolina, dos alimentos e dos remédios, mas segundo os dados da pesquisa do Cieps, a corrupção é o principal problema que desencadeou os protestos. Mais de seis em cada dez pessoas acreditam nisso, enquanto o resto opina que o principal motivo é o custo de vida. De fato, desde meados de 2020, diferentes pesquisas têm sido realizadas pelo Cieps e em todos os casos a corrupção figurou como o principal problema da sociedade panamenha.

A corrupção é atualmente o grande dilema da política panamenha. Pode ser definido como um processo que unifica uma pluralidade de demandas insatisfeitas, produto de clientelismo, má administração de fundos públicos, escassez, iniquidade, ineficiência, "el juega vivo", etc. Esta diversidade de fatores se une sob o guarda-chuva da corrupção.

Os dados apontam o aumento dos preços como "a ponta do iceberg", mas a atenção insuficiente às demandas cidadãs, bem como a gestão clientelista dos fundos públicos constituem os problemas básicos. Mas há outro grande "passivo" que tem recebido menos atenção: a falta de política.

Desde 2017, o Banco Mundial incluiu o Panamá na lista de países de alta renda, superando a renda nacional bruta per capita de $12.055, um número que o aproximou dos países do Leste Europeu. Entre 2004 e 2018 o Panamá teve um crescimento médio de 7,0% frente aos 3,3% da América Latina, este crescimento impressionante possibilitou um avanço qualitativo e quantitativo do país, mas também deixa algumas "sombras", como a incapacidade de reverter o alto grau de inequidade econômica, segundo dados da CEPAL, e a persistência de tratamento desigual de diferentes grupos humanos, o que se traduz em 82,4% das pessoas considerando que existe discriminação no Panamá.

O modelo de desenvolvimento panamenho postergou estes assuntos seguindo "um crescimento econômico às custas da política", como afirmam os especialistas Harry Brown e Clara Inés Luna. Um modelo com um desempenho macroeconômico exitoso, mas que atualmente se encontra em uma conjuntura econômica muito complicada após a maior queda em sua história para conter a pandemia em 2020, tendo que enfrentar uma dívida social histórica.

O momento da política chegou de forma abrupta diante elites e grupos de poder acostumados aos pactos e consensos em uma política que tem sido caracterizada como "de transição". O modelo atual já não tem capacidade para abordar o dissenso e o antagonismo. A irrupção da política e o imperativo de transformá-la em uma arte de tornar possível o necessário é uma das grandes provas que a sociedade panamenha terá. E isto não se resolverá com novas e criativas soluções técnicas, mas com soluções políticas que abordem as profundas assimetrias sofridas pelos cidadãos panamenhos.

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