Juntos, os 102 milhões de brasileiros mais pobres, praticamente a metade da população do país, recebeu R$ 122 bilhões a partir da transferência de renda do governo, de acordo com as declarações feitas à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2022.
Sem dúvida, quanto mais direcionados forem os gastos do governo federal para os grupos de renda mais baixa, maior será o efeito na redução do grau de desigualdade, na distribuição de renda e na diminuição da pobreza do país. Mas já não estamos falando da metade mais pobre? Afinal, esses gastos não estão focalizados?
Focalização significa adotar algum critério de priorização na concessão de benefícios. Significa dizer que a transferência de renda só será concedida a um indivíduo quando todos os outros mais vulneráveis do que ele já tiverem sido agraciados.
Esse processo envolve adotar uma priorização e persegui-la. Considerando nosso grau altíssimo de pobreza e de desigualdade, é difícil pedir paciência e espera aos que serão beneficiados só em um segundo momento.
Assim como o SUS (Sistema Único de Saúde) gerencia todos os dias as vagas para a realização de procedimentos cirúrgicos, organizar uma fila não é uma tarefa fácil, muito menos agregadora de votos.
O SUS diariamente pede a um paciente que aguarde sua vez na fila enquanto outros em situação mais grave são atendidos, mesmo assim tem gratidão e respeito da população. O que acontece quando não optamos pelo caminho da priorização e organização em um sistema de filas?
Hoje, distribuímos R$ 122 bilhões à metade dos brasileiros e, ainda assim, 20% da população vive abaixo da linha de extrema pobreza, conforme critérios do Banco Mundial. De todo esse montante desembolsado anualmente, 58% (R$ 71 bilhões) não são direcionados aos que estão abaixo da linha de extrema pobreza.
Os nossos programas de transferência de renda optam por entregar um pouco de recurso a muitas pessoas, portanto, os casos mais graves, com pouco socorro, se mantêm em situação de extrema vulnerabilidade.
Já temos orçamento e capilaridade suficiente para que nenhum brasileiro viva com menos de R$ 400 por mês, no entanto, ao optar por entregar pouco para muitos, grande parte da população sobrevive com menos de R$ 400.
Como país, optamos por beneficiar um pouco muitas pessoas e não em erradicar a pobreza.
Uma mudança de curso envolveria a retirada de benefícios de uma parte da população que tem, sim, vulnerabilidades, mas que, no entanto, não está dentro do critério de extrema pobreza. O SUS tem a gratidão e reconhecimento da população, apesar das decisões difíceis que toma todos os dias.
O que esperamos dos nossos R$ 122 bilhões de transferência de renda? Beneficiar um pouco, metade da população, sem focalização? Ou retirar o Brasil do mapa da pobreza extrema?
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