Com uma fartura de variações sobre o tema casa mal-assombrada disponível, a Netflix decidiu apostar em um suspense real envolvendo uma mansão e uma família de porta-retratos para inaugurar esta temporada de Halloween (ou Dia do Saci, como preferir).
É "Bem-Vindos à Vizinhança", minissérie em sete capítulos que estreou nesta semana com elenco de primeiro escalão e a vistosa assinatura de Ryan Murphy, ás do gênero terror que acaba de lançar o bem mais tétrico docudrama "Dahmer: Um Canibal Americano" na mesma plataforma.
O enredo de "Bem-Vindos à Vizinhança" perpassa algo caro aos americanos: a vida nos condomínios fechados de subúrbio, sem caos urbano em vista, como símbolo maior de status social e da obsessão pela propriedade imobiliária.
O caso ocorreu em 2014 (a minissérie a atualiza para o ano atual sem haver necessidade) e foi contada pela primeira vez no site The Cut, da revista New York, em 2018.
A reportagem assinada por Reeves Wiedeman serviu de base ao roteiro de Murphy e seu corroteirista Ian Brennan. Ela relata o suplício da família Broaddus, pai, mãe e três filhos (na série, dois), que se endividaram para comprar um casarão de seis quartos em uma cidadezinha a uma hora de Nova York por US$ 1,35 milhão (US$ 1,69 milhão em valores de hoje, ou R$ 8,9 milhões).
Antes mesmo de se mudarem, os novos proprietários (vividos por Naomi Watts e Bobby Cannavale) passam a receber cartas ameaçadoras de uma pessoa que assina "The Watcher", o vigilante, que é o título original da série.
Não bastassem as missivas, a idílica vida cobiçada pela família está repleta de figuras saídas de pesadelos.
Há um casal de vizinhos incomodados (Margo Martindale e Richard Kind), uma insistente integrante da associação histórica local (Mia Farrow, em seu primeiro papel desde 2011) e seu filho com deficiência mental que desconhece limites (Terry Kinney), além uma sociedade local que os olha com descrença e descaso, resumida na figura de Karen (a ótima Jennifer Coolidge, de "The White Lotus"), a amiga de juventude que vende o imóvel aos Broaddus.
Na história real, o imóvel do número 657 no bulevar Westfield acaba vendido seis meses depois por menos de dois terços do valor original após as tentativas infrutíferas dos proprietários de conseguir atenção da polícia, que nunca descobriu a identidade do autor(a) das ameaças. Na versão ficcionalizada, foram feitas modificações, mas dizer mais que isso tira a graça.
Aos poucos, a perturbação trazida pela sensação permanente de que alguém os observa, e que essa vulnerabilidade é absoluta, se embrenha na família de forma asfixiante.
Cannavale, um grande ator, e Watts, uma atriz inconstante, parecem ter incorporado os tons pálidos que seus personagens invariavelmente vestem, com interpretações opacas. Como não é raro nas produções de Murphy, porém, o conjunto do elenco funciona bem e dá conta de manter o espectador vidrado.
'Bem-Vindos à Vizinhança' está disponível na Netflix
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