Lygia Maria

Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

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Presos no eterno retorno

Poderíamos ter escapado da polarização política, mas preferimos repetir os velhos problemas

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Ano novo, vida nova. Menos para o brasileiro, esse personagem nietzscheano confinado no conceito de "eterno retorno" —segundo o qual tudo o que já se viveu será vivido da mesma forma, para sempre. Em matéria de poder, eis o nosso fardo. Parafraseando o filósofo alemão, "a eterna ampulheta da política será sempre virada outra vez, e o eleitor com ela, poeirinha da poeira!".

Jair Bolsonaro, que se elegeu como epítome de uma tal nova política, repetiu os velhos conchavos, fisiologismos e maracutaias que viraram tradição nacional. De novo mesmo, apenas o desvario e a covardia, isso não podemos negar.

Nunca um presidente proferiu tantos impropérios. Nunca um presidente fugiu do país só para não ceder a faixa ao próximo mandatário —como exigem o espírito republicano e a etiqueta dos civilizados.
"Temos um novo presidente", dirão. Mas o que aparenta ser atual já chega defasado. Pelo menos a intenção para a política econômica demonstrada até agora é uma velha conhecida: o surrado aumento populista de gastos públicos, a estratégia arcaica dos "campeões nacionais", a caduca oposição a privatizações.

O avião presidencial é visto em voo após decolar do aeroporto de Brasília, supostamente levando o presidente Jair Bolsonaro para os Estados Unidos - Pedro Ladeira - 30.dez.22/Folhapress

A mesmice não assola apenas o campo institucional. No debate público cotidiano, da conversa de botequim às redes sociais, a polarização seguirá bradando palavras de ordem, atrapalhando a vida do cidadão que queria apenas tomar uma cerveja ou rir de um meme em paz.

Nas eleições, tivemos oportunidade para, ao menos, mudar de problemas, mas preferimos manter os antigos.

Um outro filósofo, agora francês, também falou sobre uma vida baseada na repetição incessante e sem sentido a partir do mito grego de Sísifo, que foi condenado a rolar uma rocha até o topo da montanha para, no dia seguinte, refazer seu martírio sem fim. Albert Camus atesta, com a metáfora, o absurdo da existência. Contudo aponta uma saída menos trágica: "é preciso imaginar Sísifo feliz".

Sem ilha de novidade à vista, neste mar eternamente navegado, só nos resta imaginar o brasileiro feliz.

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