Lygia Maria

Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

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A direita dissonante

Não faz sentido criticar ideologização da educação federal e, ao mesmo tempo, censurar livros de bibliotecas escolares

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A dissonância cognitiva da chamada nova direita chega a ser surreal. Aliando um liberalismo rasteiro com um conservadorismo tosco e anti-intelectual, coloca-se como epítome da liberdade de expressão enquanto promove censura. Trata-se de uma direita populista e reacionária.

No caso mais recente, o governo de Santa Catarina mandou recolher nove obras literárias de todas as bibliotecas da rede pública de ensino do estado. O ofício enviado às escolas não informa nenhuma justificativa e, quando questionada pela Folha, a Secretaria de Educação não disse quais foram os critérios usados na formulação da sua lista negra.

O governador Jorginho Mello durante reunião com Lula sobre a pactuação de políticas de proteção do ambiente escolar, em abril - Eduardo Valente/SECOM

Após críticas, o governador Jorginho Mello (PL) disse numa rede social que os títulos serão redistribuídos de acordo com a faixa etária dos alunos. Mas frise-se: não eram livros usados em sala de aula, estavam parados na prateleira de uma estante. Pelo visto, o poder público de SC trata literatura como pornografia.
Em outra postagem, o mandatário criticou uma tal "agenda ideológica" da educação federal. Confirmando a dissonância cognitiva, não percebe que retirar livros de circulação é uma medida ideológica.

Sabe quem também proibia livros? Sim, a ditadura socialista da URSS, que essa mesma direita se arvora a criticar. Um deles foi "1984", a famosa distopia de ficção científica escrita por George Orwell.

As coincidências dissonantes se avolumam. Dentre as obras censuradas em SC, está "Laranja Mecânica", de Anthony Burgess, outra distopia do mesmo gênero literário. Os dois livros tratam dos limites morais da atuação da ciência, da tecnologia e do Estado sobre o indivíduo. Não à toa, ideologias que objetificam seres humanos querem censurá-las.

Nos anos 1970, o cineasta Stanley Kubrick transformou "Laranja Mecânica" em filme. Ao falar sobre os aspectos políticos da obra, em entrevista para Michel Ciment, disse: "Vale para os dois pontos de vista extremos, o de esquerda e o de direita. Os extremistas têm o mesmo desprezo pelos homens".

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