Lygia Maria

Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Lygia Maria

As mariposas e o conservadorismo

Série 'Gentleman in Moscow' mostra como essa perspectiva filosófica funciona como contenção humanista ante mudanças sociais bruscas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Até o início do século 19, quase todas as mariposas de Manchester, na Inglaterra, tinham asas brancas. Mas a fuligem das fábricas cobriu as árvores da região e dificultou a camuflagem do inseto, que passou a ser capturado mais facilmente por predadores. Com isso, a mariposa de asas escuras, antes ínfima minoria, floresceu e, após cerca de 100 anos, já era dominante no ecossistema.

O fenômeno, conhecido como melanismo industrial, é relatado pelo conde Alexander Rostov, personagem da série "Gentleman in Moscow" interpretado por Ewan McGregor. O aristocrata perde tudo na Revolução de 1917, escapa do fuzilamento por ter um amigo bolchevique e é condenado a passar o resto da vida num hotel no centro de Moscou.

As mariposas de Manchester, um caso clássico de seleção natural, são usadas por Rostov para apontar a barbárie intrínseca a qualquer tipo de revolução ou golpe.

Afinal, mesmo com a intervenção humana na natureza, foi necessário um século para que as traças escuras estabelecessem seu domínio.

Na Rússia socialista, milhares de pessoas inocentes foram encarceradas e assassinadas pelo Estado em poucos meses —prisões e matanças se seguiram por décadas. Nem mesmo a cultura (música, literatura, pintura, gastronomia, religião, arquitetura etc.) escapou do massacre.

Rostov representa a contenção conservadora que visa proteger princípios civilizatórios básicos.

O conservadorismo não é contra o novo, ele busca apenas preservar as conquistas de uma sociedade e a dignidade humana, ante transformações bruscas que não passaram pelo teste do tempo —o que inclui mudanças políticas e econômicas, no meio ambiente ou de aspectos culturais cotidianos, como a linguagem.

Essa é a perspectiva de filósofos como Burke e Oakeshott, que, como as alvas mariposas, não consegue se reproduzir no debate público brasileiro. Toda crítica a teses heterodoxas progressistas é tachada de bolsonarismo, que, por sua vez, não passa de populismo retrógrado.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.