Manuela Cantuária

Roteirista e escritora, é criadora da série 'As Seguidoras' e trabalha com desenvolvimento de projetos audiovisuais

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No Turcomenistão, só se fala de outra coisa, o assunto nunca é coronavírus

O Financial Times comparou Bolsonaro a outros líderes negacionistas da pandemia ao redor do mundo

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No Turcomenistão, só se fala de outra coisa. Nos jornais, na TV e nas mesas de bar, o assunto nunca é coronavírus. Talvez seja o tempo que não firma ou, quem sabe, futebol, já que os campeonatos seguem com partidas abertas ao público. Os cidadãos transitam pelas ruas sem máscaras e seus perdigotos flutuam serenos pelo ar.

O responsável por esse cenário bucólico se chama Gurbanguly Berdymukhamedov, o ditador que governa o país desde 2007. Ele é a mente por trás das medidas que baniram a Covid-19 do Turcomenistão.

O segredo? A proibição do nome da doença em território nacional. Em outras palavras, o coronavírus é tratado como o vilão dos livros de Harry Potter, Aquele Que Não Deve Ser Nomeado. Na capital, quem circula de máscara corre o risco de ser preso.

Formado em odontologia, Berdymukhamedov foi ministro da Saúde de seu antecessor e se considera uma autoridade no assunto. O ditador defende um método caseiro para evitar a transmissão da tal gripe respiratória —inalar a fumaça de uma erva local. Defumadores vêm sendo usados em espaços públicos e residências, embora o tratamento não seja comprovado cientificamente.

Considerado um dos países mais fechados do mundo, o Turcomenistão pode parecer um mundo distante do nosso, onde só o novo coronavírus experimenta alguma liberdade.

Mas temos algo em comum com nossos irmãos turcomenos. E esse algo em comum se chama Jair Bolsonaro. O jornal britânico Financial Times comparou nosso presidente a Berdymukhamedov e outros líderes negacionistas da pandemia ao redor do mundo.

Em vez da defumação de ervas, Bolsonaro optou por outras cortinas de fumaça, como a cloroquina. O presidente também tem suas estratégias para desviar do assunto da doença: demite um ministro aqui, acusa um governador ali, exonera um chefe da Polícia Federal acolá. Pelo menos de tédio o brasileiro não morre.

Nosso presidente pode não ser um ditador, mas já deu inúmeros sinais de que gostaria de governar como um. Seja participando de manifestações antidemocráticas, elogiando o golpe de 1964, ou queimando pontes com qualquer aliado que não se submeta aos seus caprichos.

Assim como a população turcomena, estamos encurralados entre um inimigo invisível e outro que ganhou visibilidade demais.

Ilustração de personagem que representa o Brasil, cuja forma é um mapa do país. Ele está assustado e encurralado em um canto por Jair Bolsonaro com uma caixa, na qual está escrito "cloroquina", e vários vírus no ar
Silvis/Folhapress

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