Marcelo Leite

Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

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Descrição de chapéu petrobras

Nem gás, petróleo, baleias e minérios do mar mancham imagem da Noruega

País exporta gás e petróleo, caça baleias e agora quer extrair minérios do oceano

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Agência ambiental de país com bem polida imagem verde alerta para riscos de promover a exploração de recursos no fundo do mar. Seus especialistas alegam que não há dados suficientes para garantir a segurança da operação.

Atropelando parecer técnico contrário, governo segue com o projeto de prospectar uma área de solo marinho maior que o estado de São Paulo. O Parlamento, insensível diante de poluição das águas e dano à fauna e à pesca, aprova plano temerário.

Parece o Brasil, mas não é. Poderia ser, com a tresloucada proposta do governo Lula de extrair petróleo da margem equatorial da Amazônia. Mas se trata da Noruega, campeã do bom-mocismo ambiental.

Fundo do mar
Nódulos de manganês, principais alvos da mineração do fundo do mar, na Zona Clarion-Clipperton, no Pacífico, em imagem feita em abril de 2015 - Dilvugação/JPI Oceans/Geomar

Na terça-feira (9), seus parlamentares aprovaram a mineração da plataforma continental por 80 votos a 20, noticia o boletim Nature Briefing. O Stortinget autorizou estudos de viabilidade da exploração de manganês e sulfetos no leito oceânico.

A extração, se viável, exigiria novas votações no Parlamento, explica o boletim. Mas a licença concedida para estudos é vista como a proverbial abertura de porteira para a boiada passar.

A extração de minérios do fundo do mar é controversa porque perturbaria ecossistemas, centenas ou milhares de metros abaixo da superfície, que são hoje mal conhecidos. Revolver a crosta terrestre ali quase pode destruir comunidades de organismos na base da cadeia alimentar marinha.

A área em vista abrange 281 mil km2 em torno de Svalbard, arquipélago dentro do círculo polar Ártico posto sob administração da Noruega por um tratado de 1920. O acordo garante a outros países, contudo, acesso a recursos naturais da região.

Além de sulfetos e manganês, todos estão de olho em lítio e metais como cobalto, níquel, lítio e nióbio, assim como em terras raras. São matérias-primas imprescindíveis para a transição energética: de baterias de carros elétricos e celulares a turbinas eólicas de última geração.

Incomoda aos EUA e à Europa que boa parte das jazidas terrestres desses minérios, além de finitas, se encontrem na China e em países africanos ou sul-americanos. Daí a ideia de prospectá-los no fundo do mar, ou, nos delírios à Elon Musk, na Lua e em outros planetas ou asteroides.

Países do Ártico em torno de Svalbard, com tradição mineradora como Rússia, EUA (Alasca) e Canadá, podem disputar a soberania da Noruega sobre eventuais jazidas. A preocupação imediata, porém, envolve o impacto ambiental num setor dos oceanos que já padece com a pesca insustentável, por exemplo de bacalhau.

Não são só o delicioso Gadus morhua em declínio e a captura de baleias que mancham a reputação ambiental da Noruega. O país nórdico de meros 5,5 milhões de habitantes é o quarto maior exportador de gás natural e oitavo de petróleo, ambos combustíveis fósseis —maiores fontes de emissão de gases do efeito estufa.

Como assinalou Rodrigo Tavares em sua coluna de quarta-feira (10), a Noruega —"mauricinho da Europa", diz ele— aumentou em 1,5% a produção de gás e petróleo em 2023, ano mais quente de todo o registro histórico. Em março, descobriu mais 84 milhões de barris perto do campo Troll (que não se perca pelo nome).

Apesar de tudo, os mauricinhos conseguem manter boa reputação ambiental. Tem muito a ver com o fundo soberano alimentado pela renda dos fósseis, do qual saem recursos para o Fundo Amazônia, ou para a descarbonização da economia norueguesa e a eletrificação de sua frota automotiva (80% dos carros novos).

Aqui no Brasil, vende-se a margem equatorial amazônica como nova galinha dos ovos de ouro da Petrobras, depois do pré-sal. Ouro que, como se sabe, só nutriu um dos maiores esquemas de corrupção do país, não o futuro róseo que Lula e Dilma prometiam.

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