Marcelo Leite

Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

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COP28 em Dubai ou é caô ou piada de mau gosto

Conferência só terá sucesso se adotar prazo para banir exploração de petróleo

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Não me entendam mal: a concretização de um fundo global para perdas e danos da mudança climática, na COP28 em Dubai, representa um avanço em 30 anos de negociações. Mas é pouco, e muito tarde.

Alguns países ricos prometeram depositar na conta, que será gerenciada pelo Banco Mundial por quatro anos, US$ 415 milhões (R$ 2 bilhões). Emirados Árabes Unidos (EAU), que são os anfitriões, e Alemanha se mostraram generosos, com US$ 100 milhões cada um.

Outras nações da União Europeia (EU) entrarão com o total de US$ 136 milhões. Os EUA, com US$ 17,5 milhões, e o Japão, com US$ 10 milhões –o que dá bem a medida de seu compromisso com a compensação das populações pobres da África, da Ásia e da América Latina, as mais vulneráveis a eventos extremos.

As cifras empalidecem diante do que seria imprescindível para fazer diferença. Só América Latina e Caribe perderam, em 2022, US$ 320 milhões com danos climáticos, informa Ana Carolina Amaral nesta Folha.

Homem passa perto de placa no local onde é realizada a COP28 em Dubai
Placa no local onde é realizada a COP28 em Dubai - Jewel Samad/AFP

A quebra do valor de produção agrícola no Rio Grande do Sul, em parte por impacto do clima, ultrapassa R$ 30 bilhões de 2021 para cá, noticia o colega colunista Mauro Zafalon. Isso sem contar as vidas e o patrimônio perdidos nas chuvas que assolam o Sul.

Países desenvolvidos haviam prometido bancar US$ 100 bilhões anuais, entre 2020 e 2025, para ajudar os menos desenvolvidos. Nunca cumpriram. Em 2022, os lucros das empresas petroleiras dobraram para US$ 219 bilhões.

Combustíveis fósseis como petróleo, gás natural e carvão são os principais causadores do aquecimento global. Isso não impediu os 197 signatários da Convenção do Clima de escolher logo o petroestado EAU para sediar a COP28.

Os Emirados sacaram US$ 125 milhões do bolso fundo para tentar desfazer a má impressão deixada pela denúncia de que usariam a conferência para fazer negócios com óleo. A prova de que não estão nem aí com a saúde da atmosfera foi convidar 400 mil pessoas para a COP28, gerando a maior pegada climática dessas reuniões em todos os tempos –basta imaginar quanto querosene de aviação se gastará nisso.

A COP28 só poderia ser avaliada como um sucesso se os dignitários a enxamear Dubai saíssem dali com um plano de metas e prazos para banir a exploração de combustíveis fósseis. Ganha um barril furado quem achar que os emires concordarão com tal coisa.

O governo brasileiro não fica atrás em duplicidade. Luiz Inácio Lula da Silva (PT) desfila em Dubai com crachá de líder verde: propõe outro fundo bilionário para preservar florestas, cobra cumprimento de promessas financeiras dos países ricos, exibe Marina Silva (Rede) e a queda no desmatamento da Amazônia.

Horas antes, namorava a entrada do país na OPEP, como se produzir petróleo na margem equatorial da mesma Amazônia, ainda que para exportar e não queimar aqui, fosse inofensivo para o clima. Ou resultasse inócuo o carbono emitido na destruição do cerrado com o dobro da velocidade da floresta amazônica.

O Acordo de Paris, de oito anos atrás, fixou 1,5ºC de aquecimento como limiar de segurança, mas o planeta ruma para algo entre 2,5ºC e 3ºC. Não existe sequer consenso sobre a metodologia para verificar se esse Rubicão terá sido cruzado, alerta um artigo na próxima edição da revista Nature.

Em princípio, o limiar estará superado quando a média de 20 anos ficar em 1,5ºC, o que atrasaria em ao menos uma década medidas drásticas para reverter o aquecimento excessivo. A probabilidade maior é que a ultrapassagem ocorra ainda nesta década, mas a reação ficará para o final dos anos 2030 –eis o sentido de urgência, ou o espectro dela, que ronda Dubai.

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