Marcos de Vasconcellos

Jornalista, assessor de investimentos e fundador do Monitor do Mercado

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ESG e a ética de barriga cheia

Nova regra da B3 e Reforma Tributária mostram que o tema não deveria sair do seu radar

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Começou a valer no último dia 19 o novo Regulamento de Emissores da B3, a nossa Bolsa de Valores. A novidade no regramento é um anexo com uma "medidas ASG" (Ambientais, Sociais e de Governança Corporativa) —tradução do ESG— que devem ser cumpridas pelas companhias abertas.

O anexo diz que as empresas devem ter entre os membros do conselho de administração ou da diretoria estatutária pelo menos uma pessoa que se identifique com o gênero feminino e um membro de comunidade sub-representada —preta, parda, indígena, integrante da comunidade LGBTQIA+, ou com deficiência.

Na última pesquisa sobre o tema —em dezembro de 2021— a Fundação Dom Cabral mostrou que mais de 90% dos CEOs de empresas brasileiras são homens brancos, com idade média de 50 anos. Ganha uma ação da Oi quem apontar qualquer mudança significativa nesse quadro desde a data do estudo.

Mulheres caminham em frente à sede da B3, a bolsa de valores de São Paulo
Mulheres caminham em frente à sede da B3, a bolsa de valores de São Paulo - Isaac Fontana - 14.mar.23/EFE

Além de todos os benefícios sociais de gerar diversidade no topo da pirâmide, há o financeiro, que já foi quantificado pelo banco Goldman Sachs, em estudo que citei aqui. Os fundos com mais mulheres na gestão tiveram rentabilidade maior na crise da Covid-19.

Acontece que, pelo documento da B3, as tais medidas ASG devem ser atendidas "no modelo pratique ou explique". Isso, em português, significa que quem não quiser cumprir basta explicar o motivo. Já dá para pedir para o ChatGPT elaborar uma lista de explicações que vão aparecer, como "pool de talentos limitado", "barreiras sistêmicas" e "área de atuação que exige muita especialização".

A lógica nisso é que o papel da Bolsa é exigir transparência. Julgar se é bom ou ruim adotar tais iniciativas caberia ao mercado, com valorização ou desvalorização das ações das empresas.

Enquanto a nova regra ESG da B3 segue o raciocínio de "livre mercado", a Reforma Tributária ameaça ir no caminho contrário e efetivamente punir, financeiramente, empresas que não estejam com a governança ambiental em dia.

O texto da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 45/2019 aprovado pela Câmara dos Deputados em julho traz a previsão do imposto seletivo, também apelidado de "Imposto do Pecado". Ele prevê a taxação sobre a "produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente".

A regra é muito polêmica, tanto pela lógica que segue quanto por ser impossível prever como serão definidas quais atividades serão consideradas prejudiciais ao meio ambiente. Combustíveis fósseis parecem uma resposta óbvia. Mas alguém consegue imaginar o governo cobrando mais impostos da Petrobras?

O frisson pela discussão do tema ESG parece ter esfriado conforme o dinheiro parou de circular em abundância no setor privado (efeito da inflação e dos juros altos). Os grandes fundos e líderes do mercado foram deixando o tema de lado, seguindo aquela lógica pela qual é mais fácil discutir ética de barriga cheia. Quando há pouco dinheiro na mesa, usa-se menos critérios, além do retorno esperado.

O chamados fundos ESG no Brasil ainda beiram os 50 mil investidores, entre mais de 35,5 milhões de contas que investem em fundos no país. A nova regra da B3 e o texto da Reforma Tributária mostram, no entanto, que o mundo está girando e o tema não deveria sair do seu radar.

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