Marcos Lisboa

Economista, ex-presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005, governo Lula)

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Marcos Lisboa
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Brincar de Deus para promover crescimento pode não dar certo

Há muitas possibilidades de investimento e nem todas se revelam igualmente rentáveis

Alguns políticos, incluindo candidatos à Presidência, ainda não entenderam as causas do fracasso da tentativa recente de utilizar bancos públicos para promover o crescimento.

O argumento parece simples. A expansão do crédito aumenta o investimento, estimula a compra de bens e serviços e resulta em maior geração de renda e de emprego.

Movimentação de pessoas em busca de emprego e distribuição de currículos no centro de São Paulo
Movimentação de pessoas em busca de emprego e distribuição de currículos no centro de São Paulo - Henrique Barreto/Futura Press/Folhapress

A vida, infelizmente, é mais complicada. A dificuldade é saber em que investir. Existem muitas possibilidades e nem todas se revelam igualmente rentáveis. Gastos malfeitos apenas resultam em desperdício.

No setor privado, a concorrência impõe a dura disciplina dos mercados, com gestores independentes disputando os recursos da sociedade. Aqueles que conseguem identificar oportunidades de investimento mais rentáveis dos que os títulos públicos, que são de baixo risco, são reconhecidos pelo seu sucesso e atraem novos poupadores. Os que fracassam perdem credibilidade e devem arcar com as consequências dos seus equívocos.

Maiores retornos em geral implicam maiores riscos e é recomendável saber com cuidado em que se está investindo.

O poder público deve garantir a transparência e veracidade das informações para os poupadores. Boas regras fazem com que todos os participantes saibam dos riscos e que sejam, em maior ou menor grau, sócios do resultado dos investimentos, para o bem ou para o mal.

O mesmo não ocorre com os tributos utilizados pelo governo para conceder crédito para investimento. Os gestores públicos são agraciados com recursos compulsoriamente arrecadados da sociedade para apoiar os projetos que julgam mais adequados e não são responsabilizados pelos resultados das suas escolhas.

Não surpreende o fracasso do governo anterior. Muitos investimentos revelaram-se inviáveis, como em refinarias, ou resultaram em fábricas ineficientes e com elevada capacidade ociosa.

No começo do século 20, alguns governos investiram em dirigíveis para desenvolver o transporte aéreo de pessoas e de armas. Ao mesmo tempo, empreendedores privados competiam para aperfeiçoar o avião. Muitos morreram pelas suas iniciativas malsucedidas. Outros inovaram com sucesso e aprenderam com os fracassos dos demais. Vamos para a Europa de avião, não de dirigível.

A técnica importa, mas a incerteza é inevitável. Não se sabe o que vai dar certo. A concorrência incentiva a experimentação descoordenada que, eventualmente, resulta em inovação surpreendente. Quantos medicamentos foram descobertos pela indústria planificada soviética em comparação com o descentralizado mercado farmacêutico americano?

Resta o receio de que o desastre recente não tenha servido como aprendizado.

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