Marcus André Melo

Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).

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Muitos dos fatores que engendraram junho de 2013 estão à vista

Do consumidor que se tornou cidadão zangado ao cinismo cívico

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O argumento de que o bolsonarismo ou o 8 de janeiro têm origem em junho de 2013 ou decorrem dele inverte a direção da causalidade: ele não é causa, mas sintoma. Como discuti aqui há diversos fatores envolvidos, mas podemos descartar pelo menos dois.

O primeiro é a economia. Não é razoável associar as manifestações ao fim do boom de commodities: a inflexão começou em 2012. O desemprego só explodiu a partir do último trimestre de 2014.

A inflação de 2013 (5.9%) era igual à de 2008. O superávit primário de 2013 estava no mesmo nível de 2008, e só despencaria em 2014. A crise ainda não havia se instalado e seu efeitos ainda não eram percebidos. Era assunto de especialistas.

Praça da Sé tomada por manifestantes durante o protesto contra o aumento da tarifa de ônibus, em São Paulo (SP), em 2013 - Joel Silva/Folhapress

O segundo seria o efeito difusão de uma onda internacional (Primavera Árabe, Turquia, Occupy Wall Street). Aqui a questão não respondida é por que protestos ocorrem apenas em alguns países?
O que tivemos foi, por um lado, um descompasso entre expectativas geradas pelo boom e as possibilidades de sua realização (privação progressiva, diria Gurr) como analisei aqui; e, por outro, uma crise institucional de representação associada ao padrão de governança de coalizões pelo PT. Esta forjou a percepção de um conluio generalizado: um divórcio entre atores políticos e o eleitorado, no qual os primeiros se voltam exclusivamente para seus próprios interesses. O cinismo cívico resultante produziu o "que se vayan todos".

As imagens-símbolo do "conluio" foram o aperto de mãos Haddad-Maluf, selando a aliança durante as eleições de 2012, meses antes das manifestações; e o pastor Marco Feliciano (que ficara famoso pela cura gay) eleito com apoio do PT para a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. "Não nos representam".

O timing do julgamento do mensalão foi fator conjuntural decisivo. Transmitido ao vivo, em uma corte majoritariamente indicada pelo PT, adquiriu enorme e inédita visibilidade. Dois presidentes do partido —Zé Dirceu, cassado em 2005, e José Genoino— foram condenados à prisão, a poucos meses das manifestações. Embora condenado, Genoino toma posse na Câmara, em janeiro de 2013, gerando comoção pública. Seu irmão teve assessor flagrado com 100 mil dólares na cueca, episódio amplamente noticiado na mídia. E houve tantos outros.

A corrupção torna-se questão central da agenda pública. E obviamente bandeira da oposição. Produto de uma aliança CNBB e TSE, a Lei da Ficha Limpa, nutriu-se desta fonte.

As dioceses foram a chave para as 1.6 milhão de assinaturas e para a aprovação pelo Congresso por unanimidade! As 1.500 audiências públicas sobre a lei realizadas pelo TSE idem.

Muitos dos fatores que engendraram junho de 2013 ainda estão à vista.

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