A escritora Jeanine Cummins, branca e americana, é acusada de apropriação cultural e oportunismo racial porque não preenche os requisitos necessários, segundo os inquisidores, para exercer o ofício em seu romance “American Dirt”. Ela não pode contar a história, inventada por ela, sobre mãe e filho mexicanos, porque não tem lugar de fala. Queimem os clássicos da literatura.
Não é fascinante como o autoritarismo pode se fantasiar de defesa de direitos e de representatividade numa tentativa de censurar pensamento e produção artística, silenciando por meio desse instrumento que parece estar na moda, tanto na direita como na esquerda, que é o fascismo? Fascismo do bem, nesse caso.
Para os fascistas do bem, a vida e a arte precisam seguir suas regras. Defendem as liberdades dos seus, mas são igualmente eficientes em levantar as tochas da inquisição para vozes dissonantes ou para as que não sejam as suas próprias, como no caso Cummins. Chamam os outros de fascistas enquanto apelam também à censura, aos discursos de ódio e aos linchamentos, alegando defender minorias e lutar contra desigualdades.
Outro exemplo de como a patrulha tenta cercear manifestações individuais por uma “boa causa” está na “carta das francesas”, que contestava pontos do movimento MeToo. Não entro no mérito da carta, apenas destaco um trecho. Algumas artistas que assinaram o documento disseram que os editores têm pedido que criem personagens masculinos menos sexistas. Já imaginou, que maravilha, fazemos de conta que o mundo não é machista e assim produzimos livros em que a vida é limpinha?!
A discussão sobre representatividade, sobre a importância de mais diversidade nas artes, na política, no mercado de trabalho é necessária, claro, mas não pode se sobrepor à liberdade de expressão. A defesa de tais pontos não deveria permitir que se criem mecanismos de opressão em nome de uma suposta sociedade mais justa.
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