Não faço ideia do que pensa a maioria das mulheres que não tem filhos. Impossível falar sobre a vastidão, a complexidade, o encantamento do que é ser mulher, suas idiossincrasias. Essa discussão apareceu nas redes sociais nesta semana porque Janja Lula da Silva, aquela que já dispensa aposto, subiu a rampa com a cachorrinha Resistência. Janja não tem filhos, detalhe que só me chamou a atenção por causa da polêmica da vez. Para mim é um detalhe, o que para tantos outros é sinal de egoísmo.
Um tuiteiro escreveu: "Janja subindo com um cachorro a rampa é a imagem da futilidade de uma ex-querda que glamorisa (sic) o egoísmo que não permite a uma pessoa abrir mão de metade da vida para ter um filho e equaliza animais a seres humanos".
Pouco me importa porque Janja não tem filhos, mas que maravilha os ventos que trazem para o holofote alguém que não se encaixa no padrão esperado e normaliza um comportamento cada vez mais comum. Mais comum, infelizmente, não significa menos criticado, como mostra a cretinice do comentário no Twitter.
No Brasil, 37% das mulheres não querem ter filhos, de acordo com uma pesquisa global, feita em 2020, pela farmacêutica Bayer, com apoio da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e do Think About Needs in Contraception (TANCO). Você se assustou com o número? Eu não. Ao meu redor vejo cada vez mais mulheres que tomaram essa decisão com consciência e não sofrem nenhum tipo de dilema ou se deixam incomodar por pressões.
Sobre o fator egoísmo, como disse, não sei o que pensa a maioria das mulheres. No meu caso, podem chamar de egoísmo. Se é egoísmo não ter a menor vontade ou aptidão para ser mãe, tudo bem. Se é egoísmo, me sentir feliz todos os dias com a vida que eu escolhi, tudo bem. Eu escolhi. Agradeço às mulheres que pavimentaram esse longo caminho para que eu pudesse decidir seguir um caminho diferente do que foi traçado e que parte da sociedade ainda insiste em acha que é o único.
Demorei muito tempo para poder olhar no espelho e dizer "não quero ser mãe" e a partir de então não sentir mais a cobrança da única pessoa que importa: eu mesma. Egoísta? Tudo bem. Que bom poder ser egoísta e acordar todos os dias e não me questionar por decisões que deixariam o tuiteiro muito satisfeito e que me garantiriam uma vida miserável emocionalmente.
Não me sinto menos mulher por não ter filhos, minha vida não é pela metade, não sinto culpa, não me importo, não tô nem aí. Sou egoísta? Sou e sugiro que as mulheres sejam cada vez mais egoístas, se o conceito de ser feliz passa por pensar mais em seu próprio umbigo.
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