Marina Izidro

É jornalista e vive em Londres. Cobriu seis Olimpíadas, Copa e Champions. Mestre e professora de jornalismo esportivo na St Mary’s University

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Por que no futebol ainda é tão difícil se importar com a vítima?

O esporte precisa aprender a reconhecer a violência de gênero e falar sobre ela

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Tite pediu desculpas. Um ato importante. Mas quando até um profissional de alto nível como ele, técnico de um clube enorme como o Flamengo e ex-comandante da seleção brasileira, tem dificuldade de responder a uma simples pergunta sobre um homem condenado pela Justiça, temos um problema. Não é sobre Tite, e sim um sintoma de algo maior: como o futebol, de forma geral, precisa evoluir na forma como lida com casos de violência contra as mulheres.

Em uma entrevista coletiva no último dia 25, Tite foi questionado sobre a condenação de Daniel Alves a quatro anos e seis meses de prisão por estupro na Espanha. Chamou o crime de "erro", fez um paralelo com uma acusação contra Neymar –que foi inocentado– e disse que não poderia "julgar não tendo fatos e informações verdadeiras". Os detalhes da sentença de seu ex-homem de confiança estavam disponíveis, a repercussão foi global.

Tite na convocação dos 26 jogadores que foram à Copa do Mundo do Qatar - Eduardo Anizelli - 7.nov.22/Folhapress

Dias depois, desculpou-se e, mesmo lendo uma declaração, repetiu a palavra "erro", seguiu, disse que "o crime foi julgado pela Justiça e foi condenado" e que a comparação "foi sem sentido, foi indevida". Não mencionou a vítima. Uma mulher, como milhões de torcedoras do Flamengo, e mais da metade da população do Brasil.

Há quem ache que Tite só se retratou porque recebeu uma enxurrada de críticas. Penso que é legítimo se corrigir, não vejo problema em ter lido o texto. Quero acreditar que, quando alguém como ele se posiciona, pode abrir um precedente positivo.

A pergunta do jornalista foi pertinente e obrigatória. Para os chatos de plantão que insistem que não deveria ter sido feita, vale lembrar que é normal e esperado que treinadores tenham uma opinião sobre questões que não necessariamente estejam ligadas ao jogo em questão. É assim no mundo inteiro.

Aqui na Europa, técnicos são questionados o tempo todo sobre assuntos mais sensíveis ou que nem sempre têm a ver com seus clubes, mas são relevantes naquele momento. O que eles fazem? Ué, respondem. Grandes treinadores sabem de sua influência dentro e fora de campo e de sua responsabilidade perante a sociedade. O técnico do Liverpool, Jürgen Klopp, já falou diversas vezes de tópicos que vão desde suas críticas ao Brexit –a saída do Reino Unido da União Europeia– até a importância da vacinação durante a pandemia. Pep Guardiola é imensamente respeitado, mas não escapa de perguntas sobre acusações de quebra de regras financeiras do Manchester City –e não se omite.

Falar sobre o Brexit é bem menos espinhoso do que sobre estupro, e não gosto do termo "pacto de silêncio", porque parece algo sempre intencional, e não acho que seja. Mas, se o esporte é ferramenta de mudança social, quem faz parte dele precisa aprender a reconhecer que a violência de gênero existe e ter empatia com as vítimas, em entrevistas ou dentro dos clubes, com atletas da base. Seria uma atitude importante para que os jogadores mais jovens saibam não só como gerir o dinheiro que ganham e cuidar da saúde mental, mas também como tratar as mulheres.

Brasil x EUA na final da Copa Ouro

A seleção brasileira feminina de futebol disputa, neste domingo (10), a final da Copa Ouro da Concacaf contra a poderosa seleção dos Estados Unidos. O Brasil fez bela campanha, invicta, com cinco vitórias, 15 gols marcados e um sofrido. Ganhar das americanas, na casa delas, seria a cereja do bolo. E um passo enorme na caminhada rumo aos Jogos Olímpicos.

Marcada por Karen Luna, Debinha chuta ao gol na partida Brasil 3 x 0 México, semifinal da Copa Ouro - Harry How/Getty Images/AFP

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