Marina Izidro

É jornalista e vive em Londres. Cobriu sete Olimpíadas, duas Copas e Champions. Mestre e professora de jornalismo esportivo na St Mary’s University

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Descrição de chapéu Todas paralimpíadas

As Paralimpíadas não são os Jogos da inclusão

Por que celebramos o esporte paralímpico por duas semanas e esquecemos dele o resto do tempo?

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Antes dos Jogos Paralímpicos de Londres-2012, o canal britânico Channel 4 criou a campanha "Meet the superhumans", "Conheça os super-humanos." O vídeo, um sucesso, alternava imagens de atletas com acidentes de carro, soldados feridos em combate. A tal superação. A edição de Londres teve recorde de audiência, o investimento no esporte paralímpico no país cresceu.

Para Paris, o Channel 4 mudou a abordagem por considerar, com razão, que compará-los a super-homens e super-mulheres alimenta uma narrativa errada. A mensagem em 2024 é a de que são atletas de elite, não competidores superando adversidades.

A decisão combina com o que penso há tempos: é preciso evoluir na forma como cobrimos esporte paralímpico e como tratamos pessoas com deficiência quando a competição acaba.

Na cerimônia de abertura, o presidente do Comitê Paralímpico Internacional, o brasileiro Andrew Parsons, pediu a "revolução da inclusão", lembrando que quem compete aqui em Paris não quer só medalhas, e sim igualdade para 1,3 bilhão de pessoas com deficiência.

Andrew Parsons e Emmanuel Macron na cerimônia de abertura dos Jogos Paralímpicos - Xing Guangli/Xinhua

Tem sido incrível ver arenas lotadas, esporte em alto nível. No mundo paralímpico, áreas de competição, vila dos atletas, tudo é adaptado e acessível. Mas e no resto do tempo?

No mundo real é diferente. Paris está atrás em acessibilidade em relação a outras capitais europeias, como Londres. As escadas do metrô também são perrengue para quem tem mala, carrinho de bebê. Dias atrás, uma reportagem mostrou um cadeirante passando sufoco no transporte público. Só uma em dez estações de metrô é acessível.

Cidades ganham nesse quesito quando sediam Paralimpíadas. Em minha primeira cobertura como jornalista, em Pequim-2008, vi que na China ter familiares com deficiência era motivo de vergonha, o que excluía da sociedade mais de 80 milhões de pessoas. Antes dos Jogos, o país deixou transportes, prédios públicos e pontos turísticos mais acessíveis. A Muralha da China ganhou rampas e elevadores.

Atleta paralímpica chinesa durante a apresentação, em 2006, de um dos mascotes dos Jogos Paralímpicos de Pequim-2008, na Muralha da China - Jason Lee - 6.set.06/Reuters

Na Rio-2016, houve oportunidades perdidas. É uma tortura para alguém com deficiência usar o péssimo transporte público carioca.

Temos uma imprensa, no mundo todo, que supervaloriza o futebol e só lembra de esportes olímpicos e paralímpicos a cada quatro anos. O foco exagerado em histórias de superação, em vez de performance, diminui os feitos dos competidores. Eles não são diferentes, são iguais. Barreiras criadas pela sociedade, não a deficiência, são o que eles mais superam diariamente.

Digo com a confiança de quem foi a quatro Paralimpíadas: os atletas são felizes, realizados, competentíssimos no que fazem.

Como disse o tetracampeão mundial de paracanoagem Fernando Fernandes no Sportv: Paralimpíadas não são Jogos da inclusão, são da exclusão, porque ali estão os melhores do mundo.

Portanto, a "revolução da inclusão" só virá quando o esporte for para todos e quando criarmos meios para que pessoas com deficiência possam ir e vir sem medo e façam parte de suas comunidades de forma igualitária.

O sucesso de um evento esportivo geralmente é medido por audiência de TV, número de espectadores, turismo, negócios na cidade-sede. Nos Paralímpicos há isso e mais: a chance de ser o catalisador de uma verdadeira mudança.

A colunista está em Paris como integrante da organização responsável pela transmissão oficial dos Jogos Paralímpicos

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