Martin Wolf

Comentarista-chefe de economia no Financial Times, doutor em economia pela London School of Economics.

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Descrição de chapéu Financial Times inflação juros

Tempos econômicos difíceis à frente

Bancos centrais tentam recuperar o atraso, mas não podem enfrentar diretamente o choque de energia

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Os bancos centrais estão determinados a pôr a inflação novamente sob controle. Essa foi a mensagem de Jay Powell, presidente do Federal Reserve, e Isabel Schnabel, membro influente do conselho do Banco Central Europeu, no simpósio de Jackson Hole na semana passada. Então, por que os bancos centrais insistiram tanto nessa mensagem? Eles estão certos? Principalmente, o que isso pode implicar para as políticas futuras e para a economia?

"Reduzir a inflação provavelmente exigirá um período sustentado de crescimento abaixo da tendência. As taxas de juros mais altas, o crescimento mais lento e as condições mais brandas do mercado de trabalho farão cair a inflação, mas também trarão alguns problemas para famílias e empresas. Esses são os custos indesejados de se reduzir a inflação. Mas uma falha em restaurar a estabilidade de preços significaria uma dor muito maior." Essas foram as palavras de Powell.

Schnabel argumentou novamente que os bancos centrais devem agir de forma decisiva, uma vez que as expectativas correm o risco de serem desancoradas, a inflação tem sido persistentemente alta demais e os custos de controlá-la aumentarão quanto mais a ação for adiada. Há riscos em fazer muito e em fazer muito pouco. No entanto, "determinação" para agir é uma escolha melhor do que "cautela".

Frente do prédio do Banco Central Europeu, em Frankfurt, Alemanha - Wolfgang Rattay/Reuters

Não é difícil entender por que os banqueiros centrais dizem o que estão dizendo. Eles têm uma clara missão de controlar a inflação que não conseguiram cumprir. Não apenas a inflação cheia, mas também o núcleo da inflação (excluindo energia e alimentos) está acima da meta há um longo período. É claro que esse desfecho indesejado tem muito a ver com uma série de choques de oferta inesperados, no contexto da tendência pós-pandemia para o consumo de bens, as restrições no fornecimento de energia e agora a Guerra da Ucrânia. Mas a tesoura tem duas lâminas: demanda e oferta. Os bancos centrais, principalmente o Fed, persistiram com as políticas ultrafrouxas da pandemia por muito tempo, embora a política fiscal dos Estados Unidos também fosse muito expansionista.

Em uma importante análise, Ricardo Reis, da Escola de Economia de Londres, aponta quatro razões pelas quais isso aconteceu. Primeiro, os bancos centrais interpretaram repetidamente os choques de oferta como interrupções temporárias, e não impactos quase permanentes na produção potencial. Em segundo lugar, eles interpretaram mal as expectativas de curto prazo, concentrando-se demais na média, em vez da mudança na direção de expectativas mais altas nas bordas superiores da distribuição. Terceiro, eles tenderam a ver a credibilidade como um poço infinitamente profundo, em vez de um poço raso que precisa ser reabastecido prontamente. Assim, deixaram de notar que as distribuições das expectativas de inflação em longo prazo também estavam se virando contra eles. Finalmente, sua crença numa taxa de juros neutra baixa os levou a se preocupar muito com a deflação e muito pouco com a volta da inflação. Um ponto central é que esses foram erros intelectuais. Assim como, na minha opinião, foi a desatenção aos dados monetários.

Em essência, os bancos centrais estão jogando pega-pega porque temem correr o risco de perder a credibilidade e, se perdessem, os custos de recuperá-la seriam muito maiores do que agir agora. Esse medo é reforçado pelos riscos para a inflação salarial da combinação de alta inflação de preços com mercados de trabalho fortes. O fato de os preços mais altos da energia elevarem os preços de praticamente tudo torna esse risco maior. Isso poderia então iniciar uma segunda rodada da espiral de preços e salários.

Eles estão certos em adotar essa opinião. Uma mudança para uma era de inflação alta e instável no estilo dos anos 1970 seria uma calamidade. No entanto, realmente existe o risco de que a desaceleração das economias causada por uma mistura de queda da renda real com condições financeiras mais apertadas cause uma desaceleração desnecessariamente profunda. Uma parte do problema é que calibrar o aperto monetário é particularmente difícil hoje, porque envolve aumentar as taxas de curto prazo e encolher os balanços ao mesmo tempo. Uma ainda maior é que os formuladores de políticas não enfrentam nada assim há quatro décadas.

Nos EUA, há uma visão particularmente otimista de "desinflação imaculada", promulgada pelo Federal Reserve. Esse debate se concentra em saber se é possível reduzir a pressão do mercado de trabalho reduzindo as vagas sem aumentar o desemprego. Um importante artigo de Olivier Blanchard, Alex Domash e Lawrence Summers argumenta que isso seria sem precedentes. O Fed respondeu dizendo que tudo agora é sem precedentes, então por que isso não seria? Em resposta, os autores do artigo original insistem que não há uma boa razão para acreditar que as coisas são sem precedentes. Pense nisto: como se pode esperar que um aperto monetário geral atinja apenas as empresas com vagas? Com certeza atingirá empresas que também teriam que demitir trabalhadores.

Se o aperto planejado da política monetária tende a gerar uma recessão nos EUA, o que poderia acontecer na Europa? A resposta é que as recessões provavelmente serão profundas, já que o choque do preço da energia é tão grande. Aqui também não está claro o equilíbrio entre o impacto na oferta e na demanda. Se o impacto dos preços mais altos da energia na oferta for maior do que na demanda, esta também precisará ser contida.

A política monetária desempenhará um papel na história europeia. Mas o cerne de sua crise atual é o choque energético. Os bancos centrais não podem fazer nada diretamente sobre esses distúrbios econômicos reais. Devem cumprir sua missão de estabilizar os preços. Mas um grande esforço deve ser feito para proteger os mais vulneráveis da crise. Além disso, os mais vulneráveis incluirão não apenas pessoas, mas países. Será necessário um alto nível de cooperação fiscal na zona do euro. Uma compreensão política da necessidade de solidariedade dentro dos países e entre eles é uma precondição.

Uma tempestade veio do leste da Europa. Precisa ser suportada. A melhor forma de fazê-lo será o tema de futuras colunas.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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