Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Mauricio Stycer

Um pé em cada barco

Fox oferece aplicativo para 'cord nevers', mas é caro para não afrontar operadoras de TV paga

A chegada ao Brasil do Fox+, um aplicativo que permite acessar os conteúdos dos 11 canais do grupo sem precisar assinar um pacote de TV paga, foi a grande notícia da semana no campo da TV. É um passo semelhante ao dado pela HBO em dezembro de 2017, mas com um adicional importante —futebol.

Mandy Moore e Milo Ventimiglia em cena da série 'This Is Us', que está no cardápio do Fox+ - Divulgação

A Fox, neste ano, tem direitos de transmissão no Brasil da Libertadores, Liga Europa, Campeonatos Espanhol, Italiano e Alemão, além da Copa do Mundo na Rússia. O cardápio de séries do canal inclui, entre os seus maiores sucessos, "Walking Dead", "Homeland" e "This Is Us".

Ao explicar os seus planos, o mexicano Carlos Martínez, presidente da Fox Networks Group na América Latina, referiu-se com transparência ao público-alvo do novo aplicativo: "Estamos lançando o Fox+ para millennials, para 'cord nevers', gente que nunca teve TV a cabo", disse ao repórter Nelson de Sá, antes de emendar: "Mas, se você já possui TV paga, tem o mesmo conteúdo".

Assim como fez a HBO, a Fox está tomando todo o cuidado para não caracterizar o seu investimento em streaming como uma afronta ao sistema de TV por assinatura no país. O sinal mais evidente disso é o preço do novo serviço: R$ 34,90 por mês.

Diante da Netflix (R$19,90), Globo Play (R$ 15,90) ou Amazon (R$ 14,90), o preço cobrado pela Fox e pela HBO não é competitivo. Este valor de R$ 34,90 é aproximadamente o mesmo que assinantes da Net ou Sky já pagam para ter acesso aos seis canais com o selo HBO ou ao Fox Premium.

As atrações esportivas são, de fato, um diferencial do novo produto da Fox, mas ela não é detentora de direitos exclusivos de nenhuma delas. No caso das duas competições mais populares (Libertadores e Copa do Mundo), o canal ainda sofre a concorrência da TV aberta (Globo).

Martínez é bastante franco ao dizer que "os millennials querem conteúdo, mas querem vê-lo de maneira diferente". Esta geração alfabetizada digitalmente não apenas rejeita o modelo de grade horizontal das TVs, com horários determinados para ver programas ("appointment viewing", como ele fala), como não se senta mais na sala, diante de um aparelho, para assistir. Mas quanto este consumidor estaria disposto a pagar para ver o jogo do seu time ou a sua série preferida no smartphone?

Faço essas ressalvas para chegar ao ponto central do meu argumento. A aposta de serviços contratados por streaming, eliminando a intermediação das operadoras de TV paga, ainda não é uma prioridade dos canais mais tradicionais. Eles estão se posicionando nesse novo mercado, mas com timidez, sem a intenção, por ora, de botar para quebrar. É como se estivessem colocando um pé em cada barco.

Dados da Anatel, divulgados no final de março, indicam que o mercado de TV paga perdeu 120 mil clientes em fevereiro. Nos últimos 12 meses, a queda foi de 761 mil assinantes. O Brasil hoje tem 17,86 milhões de assinantes, um número próximo ao que registrava em 2013. No seu ápice, em novembro de 2014, o total de assinantes chegou a 19,58 milhões.

O próprio Martínez, na entrevista que deu à Ilustrada, deixa claro que o Fox+ ainda não é uma prioridade. A despeito da perda de assinantes, a TV por assinatura ainda é o principal mercado para empresas como a Fox no Brasil. O novo serviço é "um complemento da TV paga", ressalta ele. Até quando?

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