Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Netflix usa recursos novelescos na série 'Harry & Meghan'

Plataforma passa por dificuldade com assinantes, com alta nos cancelamentos e baixa no número de novos clientes

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Os grandes lançamentos da Netflix costumam gerar maior burburinho por uma semana. É o tempo aproximado que leva o espectador a consumir avidamente uma série antes de partir para a próxima. Quem ainda se lembra de "Wandinha", lançada em 23 de novembro?

Mas com "Harry & Meghan", lançada em 8 de dezembro, a Netflix fez diferente. Ao final do terceiro episódio, abruptamente, aparece um aviso na tela: "Novos episódios na próxima quinta-feira".

Na narrativa cronológica da série, o corte ocorre quando faltam 24 horas para o casamento do príncipe com a plebeia. Essa facada nas costas do espectador seria esperável de uma novela da Globo. Mas de uma série documental da Netflix?

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Cena da série documental 'Harry & Meghan' que conta a jornada do casal, do início do namoro ao afastamento da família real - Reprodução/Netflix

A plataforma de streaming teve alguns motivos para agir como um canal tradicional de televisão. Como a Bloomberg publicou em outubro, além da queda no número de novos assinantes, ocorrida no primeiro semestre, a Netflix está registrando o cancelamento de assinaturas numa taxa mais alta.

Desde o início da pandemia, cerca de um quinto de todos os novos clientes nos EUA estão cancelando a Netflix após apenas um mês. A taxa de cancelamento de clientes de longo prazo também começou a aumentar. Embora esta rotatividade ainda seja mais suave do que a média do setor, os dados indicam que o serviço não é insubstituível, escreveu o colunista Lucas Shaw.

"Harry & Megan" é o primeiro fruto de um contrato assinado pelo casal com a Netflix para a produção de documentários, séries, filmes, programas de entretenimento e atrações infantis, segundo o New York Times, num valor estimado de US$ 100 milhões (cerca de R$ 530 milhões).

Em um formato bem convencional, a série mostra como eles se conheceram, as peripécias do namoro longe das lentes dos paparazzi, o impacto causado pela exposição pública do romance e, a partir da daí, a perseguição implacável da mídia sensacionalista a tudo e todos que diziam respeito aos dois.

Como uma boa novela, o drama do casal vai num crescendo angustiante. Inclui o tema do racismo (Meghan é filha de uma mulher negra e de um homem branco), que é levantado, mas sem aprofundamento. Tudo culminando, a dois dias do casamento, com a descoberta de que o pai da atriz, que a levaria ao altar, produziu fotos pessoais e as vendeu aos tabloides.

Num texto que poderia ter sido escrito por Gloria Perez, o príncipe Harry diz: "Ela tinha um pai antes disso. E agora ela não tem um pai. Eu coloquei esse peso nas costas dela. Porque se a Meg não estivesse comigo, então o pai dela ainda seria o pai dela". Quem não vai querer assistir ao próximo capítulo depois dessa?

Ao guardar um segundo lote de três episódios por uma semana, a Netflix também vislumbrou surfar na repercussão que os três primeiros alcançariam. E pensou certo: a série foi castigada com comentários furiosos de críticos e monarquistas.

Este barulho certamente ajuda a explicar o fato de que "Harry & Meghan" tenha registrado o recorde de audiência de uma série documental da plataforma em sua primeira semana.

Concordo que soa um pouco hipócrita ver o duque e a duquesa de Sussex reclamarem da mídia, que fatura horrores colocando uma lente de aumento sobre a vida do casal, enquanto eles próprios ganham milhões para contar uma versão, açucarada, desta mesma história. Mas me parece um empreendimento legítimo.

Ainda que não seja nenhuma novidade, é bom lembrar, como diz Harry, que o regime monárquico é sustentado, entre outras razões, pela capacidade de ser popular. E que a família real depende muito da mídia para transmitir a sua mensagem. O seu embate com os tabloides, da forma como a série descreve, é didático. Vale a pena ver.

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