Mauro Calliari

Administrador de empresas pela FGV, doutor em urbanismo pela FAU-USP e autor do livro 'Espaço Público e Urbanidade em São Paulo'

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O que erros e acertos no Ibirapuera ensinam sobre concessão de espaços públicos

Gestão privada melhora manutenção, mas aponta os limites de geração de caixa com eventos

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Faz relativamente pouco tempo que a Prefeitura de São Paulo começou um programa de transferir a gestão de parques municipais para entidades privadas, na esteira do que está sendo feito pelo Governo Estadual com alguns parques estaduais. Em 2020, a Urbia Parques assumiu a administração total do Ibirapuera e mais um lote de parques menores. Em 2023, o Consórcio Borboletas assumiu integralmente a gestão dos parques Trianon e Mário Covas. Como tem sido a experiência até agora?

O novo papel da prefeitura

No modelo de concessão de áreas públicas, a prefeitura deixa fazer a gestão direta, mas em compensação assume um papel relativamente novo e para o qual ela ainda não está completamente preparada, o de gestora de contratos. Em vez de contratar um funcionário para cuidar da cuidar da limpeza ou segurança do parque, ela passa a fiscalizar se a concessionária está fazendo direitinho o seu trabalho. Para isso, ela conta com Secretaria Executiva de Desestatização e Parcerias e ainda a SP Parcerias, responsável pela viabilização dos projetos. Ela é a responsável para estabelecer os indicadores de qualidade para quem importa: os usuários.

Quadra de esportes no Parque Ibirapuera, em São Paulo
Usuários jogam basquete em quadra de esportes no parque Ibirapuera, em São Paulo - Mauro Calliari

Melhorou para o usuário?

No novos contratos, está prevista uma pesquisa chamada de Sistema de Mensuração de Desempenho (SMD), que avalia da limpeza à afabilidade dos funcionários. Enquanto não ficam prontas as primeiras tomadas, foi feita uma pesquisa preliminar, contratada pela SP Parceiras. Descontado o viés da contratação, a pesquisa mostrou que mais de 70% dos frequentadores enxergam melhoras, comparando com o período em que os parques eram administrados pela prefeitura.

Bar no no Parque Ibirapuera, em São Paulo
Bar no no parque Ibirapuera, em São Paulo - Mauro Calliari

Limites na geração de receitas no Ibirapuera

Ao contrário da concessão de serviços que já geram receitas, como a operação de uma rodovia, por exemplo, os parques são gratuitos. Assim, as concessionárias que assumem esses espaços dependem da criatividade para gerar fluxo de caixa.

Numa volta pelo Ibirapuera, é fácil notar o que está sendo feito para aumentar a receita. O valor do estacionamento aumentou. A quantidade de quiosques também. Além dos antigos vendedores de coco, estão lá trailers que vendem desde café expresso a sorvetes da Baccio de Latte.

Também dá para ver a publicidade explícita de marcas nos equipamentos. Nas tabelas da quadra de basquete, Nike e Gatorade. Na quadra de tênis, Renault.

Barraca de coco no Parque Ibirapuera, em São Paulo
Barraca de coco no parque Ibirapuera, em São Paulo - Mauro Calliari

Essas ações, descontado uma ou outra surpresa, não parecem desfigurar o parque. O parque está limpo e seguro, as pessoas estão fazendo suas coisas e, ao contrário do que às vezes acontecia antes, tem até papel higiênico no banheiro. Mas há cuidados a serem tomados. Qual é o limite para tanto comércio? A enorme loja da Centauro talvez já descambe para o exagero. Será que queremos um shopping center dentro do parque Ibirapuera?

Parque Ibirapuera, em São Paulo
Loja da Centauro no parque Ibirapuera, em São Paulo - Mauro Calliari

O maior problema, porém, é quando o parque fecha algumas áreas para eventos e shows.

Na hora que você vai a um espaço público e encontra um espaço fechado, há um claro conflito. No fim de semana que vem, vai ter um show da dupla Matheus & Kauan – Praiou, com ingressos a R$ 154. Na minha visita, quatro dias antes do show, a área já estava sendo fechada e havia dezenas de funcionários montando a estrutura. Quem não paga, fica de fora, ouve a barulheira do show, não pode ver nada e ainda dá de cara com os tapumes de metal.

Como melhorar os contratos a partir de agora

Na concessão de novos espaços públicos, o município precisa ficar atento para alguns princípios. O primeiro deles é a garantia de que não se vai lotear os parques, que são, justamente, lugares para fugir da confusão da cidade.

Em caso de dúvidas, é bom ter um fórum para discutir problemas. Esse é papel dos conselhos de parques, que precisa ser reforçado nos contratos. São frequentadores, técnicos da Secretaria do Verde e instituições que deveriam ajudar os gestores a corrigir exageros.

Se há aprendizados no caminho, o prazo de até 35 anos de concessão precisa ser rediscutido. No caso do Estádio do Pacaembu, isso faz sentido para permitir a amortização de investimentos, mas em alguns parques, como o Trianon, por exemplo, com baixíssimos investimentos previstos, não se justifica segurar tanto tempo um concessionário, se algum problema surgir.

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Fachada do Estádio do Pacaembu - Rubens Cavallari/Folhapress

Uma boa ideia do contrato do primeiro lote de concessões foi juntar o Ibirapuera, o maior e mais atrativo, a outros parques menores –Lajeado, Tenente Brigadeiro Faria Lima, dos Eucaliptos, Jacintho Alberto e Jardim Felicidade. Eles têm pouco potencial de geração de receitas, mas na teoria se beneficiam de um gestor interessado em manter o bloco todo funcionando. A avaliação preliminar mostrou que esses parques ainda estão devendo na oferta de equipamentos, mas já melhoraram na percepção de segurança. O medo de perder o Ibirapuera, ou outros parques grandes, é o instrumento certo de pressão para o concessionário melhorar a gestão dos parques menores.

A prefeitura diz que há uma economia de R$ 34 milhões de reais por ano para os cofres públicos na gestão desses oito parques. É dinheiro que fica disponível para outras atividades essenciais. A questão é discutir modelos que possam ser replicados para melhorar a gestão de todos os 107 parques municipais e da complexa rede de espaços públicos da cidade.

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