Cemitérios de São Paulo investem em visitas monitoradas após concessões

Locais têm obras de arte e túmulos históricos, mas estão deteriorados por anos de vandalismo e esbarram em burocracia para restauro

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São Paulo

Na área central do Cemitério São Paulo, em Pinheiros, na zona oeste da capital, um conjunto de esculturas em liga metálica se destaca no cenário repleto de obras de arte. Feita em 1944 pelo italiano Galileo Emendabili, a escultura "Ausência" retratava o luto de pai e filho à mesa, diante de um pão e de um banco vazio representando a falta da mãe.

Com o tempo as ausências aumentaram. O banco e a escultura do pão foram levados por vândalos, sobrando a mesa de metal e as duas estátuas. Segundo a ficha de um processo do Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico de São Paulo), era a obra preferida do homem que idealizou o mausoléu mais importante de todo o estado: Emendabili também projetou o Obelisco do Ibirapuera, que guarda os restos mortais dos heróis da Revolução Constitucionalista de 1932.

Detalhe de escultura em túmulo no Cemitério Necrópole São Paulo, que lança a temporada de visitas monitoradas gratuitas para o público conhecer suas obras de arte
Detalhe de escultura em túmulo no Cemitério Necrópole São Paulo, que lança a temporada de visitas monitoradas gratuitas para o público conhecer suas obras de arte - Eduardo Knapp/Folhapress

Apesar das depredações, ainda há dezenas de túmulos ilustres e obras de arte com valor histórico inestimável no local. A partir deste domingo (29), haverá visitas monitoradas periodicamente para apresentar o patrimônio da Necrópole São Paulo, como também é conhecido o cemitério, com a participação de uma historiadora e um roteirista. Os dois integram a Associação Brasileira de Estudos Cemiteriais.

Este será o segundo cemitério paulistano a oferecer o serviço de visitas com orientação histórica desde que os equipamentos municipais foram repassados à iniciativa privada, em março. O cemitério da Consolação também começou a receber visitas em agosto.

Como mostrou a Folha, a concessão resultou em aumento dos preços de serviços funerários básicos para a população. O velório mais simples passou de R$ 299,85 para R$ 1.443,74. Esses valores estão previstos no contrato feito com a Prefeitura de São Paulo e valem para famílias que ganham mais do que três salários mínimos.

"Temos dois desafios importantes. Um é proteger o patrimônio que sobrou. É o que urge agora, porque muito já foi usurpado", diz Thiago de Souza, idealizador do projeto realizado no Cemitério São Paulo. "Outro desafio é pensar qual é a ação que vai fazer as pessoas enxergarem e usufruírem os cemitérios. Essa é a nossa proposta."

Entre os destaques da Necrópole São Paulo estão esculturas de artistas como Victor Brecheret e Alfredo Oliani, além de túmulos de personalidades como o primeiro astro do futebol brasileiro, Arthur Friedenreich, o escultor Nicola Rollo, o dramaturgo Antônio Abujamra e o cineasta José Mojica Marins, o Zé do Caixão.

O projeto conta também com a organização da historiadora Viviane Comunale e já teve duas edições informais nos últimos meses. A intenção é contar a história da cidade por meio dos monumentos do cemitério, partindo do pressuposto de que ali estão enterradas figuras que marcaram desde o esporte até a política.

Os passeios devem ocorrer mensalmente e serão divulgados nas páginas do Grupo Cortel (@cortelsaopaulo) e do projeto "O que te assombra?" (@oqueteassombra) nas redes sociais. Isso ao menos até o início de 2024, quando a concessionária pretende organizar um calendário padronizado para as visitas.

Segundo o diretor-executivo da Cortel, Rodrigo Macedo, a empresa estuda ainda outras ideias, como disponibilizar informações sobre sepulturas e obras de arte por meio de QR code e vincular essa ferramenta aos passeios. Não se trata, contudo, de uma novidade. Esse serviço já é oferecido pelo site Memoriall em parceria com cemitérios da capital paulista.

A restauração dos mausoléus e obras de arte deterioradas também é avaliada, mas a empresa esbarra em dois entraves. Um é o processo de tombamento do cemitério; outro é a propriedade das famílias sobre os túmulos.

"O Cemitério São Paulo, em especial, está num processo de tombamento junto à prefeitura e ao estado. A gente já participou de algumas reuniões com órgãos responsáveis, não podemos fazer qualquer tipo de intervenção por causa desse processo", disse Macedo. "E não vamos deixar de fora as famílias que são proprietárias dessas sepulturas, não podemos fazer absolutamente nada sem o consentimento delas."

Visita mediada - Necrópole São Paulo

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