Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Mônica Bergamo

Forças Armadas não são imunes a críticas, diz grupo de juristas e advogados

Prerrogativas afirma que resposta a declarações de Omar Aziz é autoritárita e tenta intimidar o Senado

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O grupo Prerrogativas, que inclui juristas, advogados, professores, pareceristas e ex-membros do Ministério Público, acusa o ministro da Defesa, Braga Netto, e os comandantes das Forças Armadas de intimidarem o Senado Federal ao divulgarem nota de repúdio a declarações feitas pelo presidente da CPI da Covid, o senador Omar Aziz (PSD-AM), na quarta-feira (7).

Aziz afirmou que havia muitos anos que o Brasil "não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo". Em resposta, Braga Netto e os comandantes compartilharam nota em que afirmam que o senador, em sua fala, desrespeitou os militares e generalizou esquemas de corrupção.

"As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro", disseram.

O grupo Prerrogativas acusa a iniciataiva de "intromissão no funcionamento de um dos poderes da República" e classifica o gesto como autoritário.

"O ataque ao parlamentar que comanda as investigações e que expressa de forma legítima sua perplexidade ante à corrosão moral de alguns oficiais militares não deveria gerar essa reação corporativa e autoritária por parte das cúpulas castrenses", diz nota desta quinta (8).

"É inaceitável que as Forças Armadas continuem a se arvorar como reserva moral da nação e guardião da ordem. Tal propósito não encontra guarida em nossa Constituição. Mais inaceitável ainda é um ministro de Estado, ocupante da pasta da Defesa, produzir mensagem intimidatória ao exercício de um dos poderes da República", segue o grupo.

Na quarta, a CPI ouviu o depoimento do ex-diretor de logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias. Ele foi exonerado pelo governo Jair Bolsonaro (sem partido) na semana passada, após denúncia de pedido de propina revelada pela Folha.

A sessão terminou após Aziz determinar a prisão de Dias. Segundo o senador, o depoente mentiu em diversos pontos de sua fala.

Durante a sessão, Aziz fez comentários que irritaram o alto comando militar do país.

Ao responder uma pergunta do senador, Dias disse que foi sargento da Aeronáutica. Aziz então disse que "os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados com algumas pessoas que hoje estão na mídia".

Em sua nota, o Prerrogativas ainda afirma que as Forças Armadas não são imunes a críticas. "O Brasil caminha para 600 mil mortes causadas pela pandemia em cujo descontrole um dos ministros da Saúde era exatamente um militar da ativa", diz, em referência ao ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello.

Leia, abaixo, a íntegra da manifestação do grupo Prerrogativas:

"O grupo Prerrogativas, que reúne juristas, professores de direito e profissionais da área jurídica, movidos permanentemente pelo resguardo da Constituição da República, vem denunciar o caráter institucionalmente anômalo e ameaçador da nota oficial publicada ontem (7/7/2021) pelo Ministério da Defesa, subscrita pelo respectivo ministro de Estado e pelos comandantes das Forças Armadas.

O nítido propósito da nota consiste na intimidação ao livre exercício das atividades do Senado Federal, na medida em que promove recriminação a um pronunciamento do senador Omar Aziz, presidente da CPI que investiga desvios governamentais no combate à pandemia da Covid-19.

Trata-se, portanto, de ato de intromissão no funcionamento de um dos poderes da República —o Legislativo— que ora desempenha a sua incumbência de controle das ações do Executivo, conforme previsto no texto constitucional e atendendo a determinação do poder Judiciário.

Ao fazê-lo, o Ministério da Defesa reincide em viciadas práticas recentes, notadamente quando, em 2018, o general Villas Boas, então comandante do Exército, acossou o STF com um tuíte divulgado pouco antes do julgamento de um habeas corpus impetrado pelo ex-presidente Lula.

As Forças Armadas não são imunes a críticas. Ao contrário. Mantiveram uma ditadura por mais de duas décadas e até hoje parece que não conseguem conviver com os imperativos da democracia.

O envolvimento de alguns de seus membros, da ativa e da reserva, em graves irregularidades administrativas merece a rigorosa investigação, empreendida pela CPI do Senado. O ataque ao parlamentar que comanda as investigações e que expressa de forma legítima sua perplexidade ante à corrosão moral de alguns oficiais militares não deveria gerar essa reação corporativa e autoritária por parte das cúpulas castrenses.

Na verdade, a manifestação do Senador Omar Aziz, Presidente da CPI, cumpre o relevante papel de revelar os motivos e os autores do fracasso governamental no enfrentamento da pandemia.

É inaceitável que as Forças Armadas continuem a se arvorar como reserva moral da nação e guardião da ordem. Tal propósito não encontra guarida em nossa Constituição. Mais inaceitável ainda é um ministro de Estado, ocupante da pasta da Defesa, produzir mensagem intimidatória ao exercício de um dos poderes da República.

Otto Maria Carpeaux, que em 1940 escapou por um triz do Nazismo na Europa, cunhou a célebre frase “na democracia, se baterem à porta de sua casa de madrugada, é o leiteiro”. Todas as democracias do mundo dormem tranquilas. Em nenhum país civilizado e democrático a democracia deve sofrer ameaças de forças militares.

Lamentavelmente, no Brasil, passa dia, passa mês, passam anos e lá vêm de novo as Forças Armadas ameaçando as instituições democráticas. Sequestraram o leiteiro, para que nunca saibamos que, quando alguém bate na porta, é ele mesmo —o leiteiro— ou algum pretendente a ditador.

O Brasil caminha para 600 mil mortos causadas pela pandemia em cujo descontrole um dos ministros da Saúde era exatamente um militar da ativa. A CPI instalada no Senado busca apurar as responsabilidades, havendo confiáveis pesquisas mostrando que a omissão governamental causou, no mínimo, 150 mil mortos a mais.

É disso que precisamos: apurar as responsabilidades por esse genocídio. E não de ameaças à democracia."

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.