Nina Horta

Escritora e colunista de gastronomia, formada em educação pela USP.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Nina Horta

Comidas que não comíamos

Continua a caçada; falaremos sobre kale, avocado, grão-de-bico e laranja cara cara

Continua a caçada das comidas que não comíamos faz tempo por falta de oportunidade e preguiça.

A kale, com seus cinquenta tons de verde, foi batizada de couve frisada e já está no cotidiano. Hoje mesmo chegou uma kale nova, toda arrepiada, ou melhor, frisada, parecida com a nossa das hortas de sítio que vimos por saecula saeculorum. Só que mais coquete, parecendo recortada por mão de freira --lembram-se daqueles santinhos que as freiras pintavam e rendavam com pequenas tesouras finas?

Hoje deu vontade de grão-de-bico. Ficamos mastigando os farros, os amarantos, e esquecemos dos velhos amigos. Estava frio, e ele bem quentinho, com caldo grosso, feito como feijão e, pasmem, servido em tigelas individuais com couve frisada por cima e, lá dentro, paio e uns pedaços de galinha da geladeira.

Avocados em festival no Parque Villa-Lobos
Avocados em festival no Parque Villa-Lobos - Alberto Rocha/Folhapress

Nada mal. Aqui em casa, rasgar a couve é novidade. O método é mineiro, sagrado, tradição de cortá-la fininha como fios de cabelo. Toda couve mais grossa sempre foi olhada com certo ar de desaprovação.

Na semana passada, estudando os brócolis, nos lembramos do macarrão feito com brócolis e linguiça e pimenta-calabresa e um belo parmesão. Por que esquecer dessas coisas gostosas? Os leitores bem que podiam contribuir com endereços onde se vendam bons, ótimos embutidos.

Na maioria dos livros de oito quilos americanos (não fui votar com eles por causa do peso), aparece, avassalador, o abacate (ou avocado). Que virou o queridinho de todos os sanduíches fazendo o papel de maionese e manteiga.

O Brasil e Cuba são os únicos lugares onde ele é comido com açúcar, e nós levamos uns 50 anos para acostumar a comê-lo com sal. Fiz uma entrada com ele que agradou principalmente aos olhos. Pratos pequenos de cristal transparente forrados com fatias finas de limão e sobre elas duas bolotas médias de abacate feitas com boleador de sorvete e muito bem temperadas com um vinagrete metade salsa metade coentro. Um pãozinho quente ao lado, e só. Mentira, não resisti e pus sobre eles um punhado alto de batatinha palha para dar crocância. Eram cores pálidas sobre cristal, ficaram bonitas.

O que andava me deixando louca era a "cara cara". Desconfiei que era um cítrico, pois estava perto deles num livro, mas nada de achar. Tenho umas amigas no Face que sabem de tudo, perguntei, e a resposta veio rapidamente. A laranja cara cara é colhida entre junho e julho, podendo ser antecipada ou retardada em função das temperaturas médias da região. É uma laranja de umbigo, originária provavelmente por mutação genética espontânea da gema "Washington Navel". As frutas são de tamanho médio e grande, pesam entre 190 g e 260 g, possuem casca grossa com certa rugosidade, de cor alaranjada.

Uma das características interessantes desse citro é a polpa laranja-avermelhada, conhecida como laranja da polpa vermelha, devido ao alto teor de licopeno, tendo boa quantidade de suco, alta concentração de açúcares e não tem sementes.

Parece gostosa e me parece a laranja-baía, com umbigo, só que vermelha. Laranja vermelha fica linda em qualquer prato ou bebida. Há anos que vivo catando laranja sanguínea por boniteza, conheci lá em Limeira. Se vocês quiserem saber mais, aliás, tudo sobre laranjas, comprem pela Amazon o livro "Oranges", de John McPhee. É um jornalista literário, começa a escrever um artigo, logo vira livro, numa linguagem deliciosa.

E sabem o que me deixou superalegre de ter aprendido? Sabem quando o alho começa a germinar, e a gente até tira aquela coisinha do meio para picar? Pois o certo é plantar num vaso da cozinha e em três meses ele já pode ser comido, pequenino, doce, com folhinhas e tudo.

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.