Nosso estranho amor

Paixões, desencontros, estabilidade e loucuras segundo Anna Virginia Balloussier, Pedro Mairal, Milly Lacombe e Chico Felitti. Uma pausa nas notícias pra gente lembrar tudo aquilo que também interessa demais.

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Nosso estranho amor
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O que fica quando termina?

O bom é que a gente não acaba; a gente, de um jeito ou de outro, renasce

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Milly Lacombe

O que eu mais lembro é da gente na mesa de jantar da sua casa.

Não sei bem por que, mas é essa a imagem que volta a todo instante.

Lembro de como nossos pés se buscavam embaixo da mesa; de como você me olhava e sorria.

Lembro de como a gente negociava os sushsis e sashimis que você pedia pelo aplicativo. De você saindo pela porta para descer e pegar o pacote com o entregador enquanto eu colocava a mesa.

Você gostava do de salmão skin, eu gostava de hot roll, então a gente barganhava peças.

O que eu mais lembro é da gente na mesa de jantar da sua casa - Divulgação

Lembro de como você me servia de mais vinho quando a gente acabava de comer, e de como, depois do jantar, você ia para a janela e, de pé, acendia um cigarro apoiando a taça de vinho no parapeito.

Eu sentava no sofá de frente para você e a gente falava da vida.

Durante os últimos cinco anos, minha vida teve você e essa imensidão que te habita.

Dormir do seu lado, colocar a cabeça no seu ombro, te encarar dormindo.

Quando uma história acaba, o que fica na memória não tem nada de extraordinário.

É a miudeza que deixa a gente com vontade de viver tudo de novo e chorar de saudade.

É andar com você pela praia, parar e tomar um sorvete.

É pedir aquele mate com um pouco de limão.

É ver a Vera correr desembestada pela areia ou pela grama.

É levar a Vera para passear depois que o sol se foi.

Voltar para casa, limpar as patinhas dela e perguntar se você quer ver alguma coisa na TV.

É rir do seu mau humor quando ele se transforma em comentários ácidos e certeiros.

É arrumar as coisas no carro para viajar e depois desarrumar quando chegamos. É perguntar cadê a chave da casa e notar que está comigo.

É ver a silhueta do seu corpo tão perfeito passando creme no banheiro depois do banho enquanto eu te espero deitada na cama.

É o gosto do seu beijo, o melhor beijo que já ganhei.

É testemunhar as ideias se encadeando na sua cabeça. É ter a certeza de que a inteligência humana é um órgão sexual.

Eu poderia falar da viagem a Cuba ou a Nova York, poderia falar da primeira transa, do primeiro gozo, de como um dia fizemos enormes planos para o futuro.

Mas não é isso o que primeiro me vem.

É mesmo o miudinho, sabe. É o comezinho que me mata de saudade.

Mas o bom é que a gente não acaba depois que morre. A gente, de um jeito ou de outro, renasce.

Eu acho que tudo tem a capacidade de renascer.

As coisas todas elas morrem e renascem de outro jeito.

Mas o miudinho fica acessível na memória; é só fechar os olhos e voltar.

É o amor a única força que transcende o tempo-espaço. A física concordaria.

Pensando assim, o amor seria uma ficção científica. Só que ao mesmo tempo não é nem ficção nem científico; é bastante real e é misterioso.

O que vivi com você foi de uma realidade desmedida.

Uma realidade tão cortante, tão potente, tão bonita que me deixa até sem jeito de ficar triste agora.

O privilégio de frequentar você, de me enfiar em sua vida, de me misturar ao seu dia a dia.

De fazer amor com você, de passar horas deitada na cama com seu corpo colado ao meu, de comer panqueca de banana com você, de passear pelas ruas de mãos dadas num sábado qualquer.

O que me tranquiliza nos momentos de maior tristeza é saber que haverá para sempre no universo um ambiente que é só meu e seu.

Um lugar que ninguém mais conhece ou tem a senha para frequentar. Uma dimensão onde você e eu vibraremos até que o Sol exploda em quinquilhões de pedacinhos.

Ou nem isso porque mesmo nessa hora meu pedacinho vai em busca do seu pedacinho.

Obrigada, meu amor, pelos cinco anos mais potentes da minha vida.

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