O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) publicou dois livros em que mostra o peso na Selic do crédito direcionado (subsidiado). Um dos autores, o pesquisador Ricardo Bacelette, 42, afirma que essa modalidade representa metade do total de empréstimos no país e força os juros pelo Banco Central.
Em entrevista, ele explica que essa modalidade de crédito acaba atrapalhando a política monetária do BC porque, por terem juros abaixo da Selic, forçam o regulador a elevar ainda mais a taxa básica para conter a inflação.
Há razão para a pressão do governo para que o BC reduza a Selic? [O economista John Maynard] Keynes ensinou que demanda causa inflação. Mas como explicar inflação elevada em países em desaceleração ou recessão? Se a Selic é excessiva —e eu não descarto essa hipótese—, a inflação estaria abaixo da meta e não no teto. Se com a taxa nesse nível elevado temos uma inflação no topo da meta nos últimos seis meses, como estaria a inflação se a Selic estivesse mais baixa? Teorias e crenças estão sendo confrontadas pela realidade.
O governo então tem sua culpa? Um dos diagnósticos que fizemos no Ipea é que o grande volume de crédito direcionado pressiona a Selic. Essas operações que contam com capitalização do Tesouro, equalização ou outras formas de subsídio, afetam o fiscal [balanço entre gastos e receitas] e aumentam a necessidade do estado se financiar. O governo precisa oferecer mais prêmio [juros] para quem compra seus papéis. Como cerca de metade do mercado de crédito é direcionado —ou seja, usa taxas menores que a Selic—, a política monetária perde potência.
Como assim? Como o crédito direcionado escapa da Selic, o BC precisa elevar mais ainda a taxa para manter sua efetividade. A potência de política monetária sobre a demanda caiu de 94%, entre 2006 e 2008, para aproximadamente 85%, entre 2013-2015. Numa situação assim, é preciso manter a Selic a 10% ao ano, por exemplo, para se ter o mesmo efeito contra a inflação de uma taxa de 8,5%.
O governo diz que o crédito direcionado não tem esse peso todo. No passado, o crédito direcionado se expandiu via Tesouro. Até 2009, o BNDES buscava recurso no Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que era remunerado pela TJLP, mesma taxa oferecida ao tomador pelo BNDES, que ainda cobrava um spread.
No entanto, os recursos do Tesouro tinham o custo financeiro da Selic, mais alta que a TJLP. A diferença entre a taxa que o BNDES remunerava o capital da União (TJLP) e a taxa pela qual a União captava recursos (Selic) foi um subsídio implícito pago pela União. Essa dinâmica hoje ainda está mantida via TLP e Selic.
RAIO-X
Formação: Relações Internacionais pela UnB
Carreira: Atuou em consultorias e organismos internacionais e foi assessor no Ministério da Indústria e Comércio (2006-2007); em 2011, passa a ser pesquisador do Ipea. Em 2019, foi cedido ao Ministério da Economia como assessor da Sepec
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.