O vale-refeição e o auxílio-alimentação, benefícios que as empresas concedem aos seus funcionários em troca de descontos no Imposto de Renda, se tornaram um enrosco para o governo que, para regulamentar as novas regras, enfrenta o interesse dos maiores bancos do país.
Conhecidas como tiqueteiras, as três grandes empresas do ramo —Alelo (Bradesco e Banco do Brasil), Ticket (Itaú), e Sodexo— tentam, por meio de emendas junto a deputados federais, modificar a legislação que, na prática, pôs fim à compra e venda de vales e tenta quebrar a concentração nesse ramo. O Santander, dono da Ben, também atua.
Neste momento, o Congresso só tem de decidir se prorroga para maio de 2024 o prazo definido para a regulamentação de pontos específicos da lei.
A MP, prevendo o novo prazo, vence em setembro deste ano sem que um ministério tenha definido as regras para o funcionamento dos vales até o momento. Trabalho e Fazenda disseram que preferem deixar a questão para mais tarde porque discutem reformas estruturantes.
Um dos pontos que exige regulamentação é o que trata da portabilidade. Por ela, cabe ao trabalhador —e não à empresa— escolher a fornecedora do vale. O outro é o que obriga as maquininhas das tiqueteiras (que fazem a leitura dos cartões) a aceitarem todos os vales, o que se chama interoperabilidade. Existem cerca de 300 cartões no mercado.
Mercado paralelo
No passado, uma lei proibiu a compra e venda desses tíquetes, ponto mais sensível porque as empresas movimentavam cerca de R$ 150 bilhões somente nessas transações.
O negócio funcionava da seguinte forma: o departamento de Recursos Humanos comprava os vales com descontos que variavam entre 3% e 5%. Nas ruas, os bilhetes eram negociados com ágios maiores, entre 20% e 40%.
Ou seja: além da isenção fiscal, as companhias também ganhavam com a negociação dos vales.
Na outra ponta, as tiqueteiras mais que recuperavam os descontos cobrando uma taxa de administração dos estabelecimentos (basicamente restaurantes) que varia entre 7% e 9%.
No Congresso, essas empresas, representadas pela ABBT (Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador) e também por seus acionistas, apresentaram quase 60 emendas ao texto da MP em discussão no momento. Na prática, essas emendas tornam a legislação inócua.
Segundo a ABBT, o setor não é contrário à norma, mas pretende ter mais tempo para discutir a regulamentação.
O maior problema reside na portabilidade. Para a associação, cabe às empresas a decisão de oferecer vales e auxílios. Portanto, são elas que têm a prerrogativa de negociar com os fornecedores.
"Até por uma questão de mercado. Quando uma empresa negocia com volume, consegue melhores condições", disse Alaor Aguirre, presidente do conselho da ABBT. "Com a portabilidade, o RH perde esse poder de negociação."
A outra opção, ainda na avaliação da entidade, seria destinar recurso na conta do trabalhador referente à alimentação para que ele mesmo decidisse o que fazer. No entanto, não existe previsão legal para isso.
Com Diego Felix
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