Patrícia Campos Mello

Repórter especial da Folha, foi correspondente nos EUA. É vencedora do prêmio internacional de jornalismo Rei da Espanha.

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Patrícia Campos Mello

A ascensão e queda de Lula, aos olhos da mídia estrangeira

Publicações exaltaram euforia no fim dos anos 2000 e comemoram condenação agora

No dia 2 de abril de 2009, o então presidente americano Barack Obama disse uma frase que ficaria famosa, referindo-se ao então presidente Luiz Inácio Lula da Silva: “Esse é o cara. Eu amo esse cara. Ele é o político mais popular do mundo.”

Seis meses depois, a revista Newsweek publicou uma matéria intitulada: “O brasileiro Lula: o político mais popular do mundo”

Lula estava em Nova York para participar da Assembleia-Geral da ONU, e a revista afirmava que as câmeras poderiam estar focando Barack Obama ou autocratas controversos como Hugo Chávez e Mahmoud Ahmadinejad, “mas a maior estrela será o ex-torneiro mecânico barbudo e brusco: o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva.”

“Com sua liderança, o Brasil resistiu à crise financeira global melhor do que qualquer outro país: nenhum banco quebrou, a inflação está baixa e a economia voltou a crescer”.

Nove anos depois, o “político mais popular do mundo” teve sua prisão decretada. A imprensa estrangeira, que tanto incensara o líder brasileiro, havia mudado radicalmente o tom.

A revista britânica The Economist retratou a ascensão e queda do Brasil com suas capas do Cristo Redentor decolando em 2009 e caindo em 2013.

“Em relação a políticas sociais inteligentes e aumentar o consumo doméstico, o mundo em desenvolvimento tem muito mais a aprender com o Brasil do que com a China” dizia a revista do cristo em alta.

“Lula está certo ao dizer que seu país merece respeito, e ele merece muito da adulação que recebe. Mas ele também tem sido um presidente sortudo, colhendo os frutos de um boom de commodities e partindo de uma base sólida para crescimento construída por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso.”

Bem antes disso, na véspera da primeira eleição de Lula, a bíblia do empresariado global se desmanchava em elogios.

No artigo “O significado de Lula”, a Economist afirmava:  

“A primeira coisa a dizer é que uma vitória para o senhor da Silva seria um triunfo para a democracia brasileira. Em uma região que foi governada durante muito tempo por generais ou aristocratas, isso seria impensável pouco tempo atrás. A história de vida de Lula é uma saga de mobilidade social digna de uma novela.”

O PT, “em vez de teoria marxista, luta por democracia radical e justiça social em um país profundamente desigual”.

Na quinta-feira (5), após a decisão do Supremo que tornava inevitável a prisão de Lula, mas ainda antes da ordem do juiz Sergio Moro, a revista dizia que a pena longa, que poderia começar a qualquer momento, parecia “desproporcional”.

“Isso importa porque Lula continua a ser reverenciado pelos brasileiros mais pobres por causa dos programas sociais que implementou”, acrescentando que sua prisão seria histórica para a democracia brasileira.

Mas concluía defendendo a operação Lava Jato. “A despeito dos riscos e falhas, a ofensiva anticorrupção é um avanço”

Em 2010, o Financial Times, na véspera da vitória de Dilma na eleição, dizia que “aparentemente, o Brasil nunca esteve tão bem”

O colunista Gideon Rachman, no mesmo FT, comparava Lula a Mandela. “Lula não conseguiu ter o mesmo reconhecimento global e santidade secular que Nelson Mandela. Mas os mitos de Mandela e Lula têm algo em comum. Em ambos os casos, uma emocionante luta pessoal se fundiu a uma envolvente história nacional, transformando um único homem em um símbolo potente da transformação de um país.”

“Apesar de todas as ressalvas inevitáveis, Lula vai merecer muito dos elogios e da fanfarra que cercam sua aposentadoria”.

Em editorial publicado nesta quinta-feira (5), o FT comemorava a condenação de Lula, afirmando que ela demonstra que “ninguém está acima da lei no Brasil”.

“E Lula tampouco é o santo que frequentemente dizem que ele é.”

E relativiza as conquistas do governo Lula.  “Durante seus mandatos, de 2003 a 2011, a proporção de brasileiros vivendo na pobreza caiu pela metade. São conquistas notáveis. Mas não são mais notáveis do que o que aconteceu em países com governo centrista como Chile e Peru, e muitos outros países sul-americanos que também se aproveitaram do boom dos preços das commodities. A presidência de Lula pode ter sido mais carismática que a deles, mas os resultados não foram muito diferentes.”

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