Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Por que a 'Reaganomics' zumbi ainda domina o Partido Republicano

"Make America Great Again" está no comando, mas a política serve aos ricos

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Qual é o meu plano para os próximos dois anos? Serei feliz, saudável e bem-sucedido. O que vou fazer para conseguir essas coisas? O que você é, um marxista?

Agora resumi a essência do Compromisso com a América, anunciado pelos deputados republicanos na semana passada. Esse "plano" obviamente pretende evocar o Contrato com a América de Newt Gingrich, de 1994, que foi seguido por uma tomada republicana do Congresso.

Mas o Contrato com a América, ame-o ou odeie-o –fico na segunda categoria–, oferecia uma agenda política bastante específica, com uma lista de leis planejadas. O que os republicanos acabaram de divulgar, em comparação, é principalmente uma lista de coisas boas que eles afirmam que vão acontecer, com apenas uma dica de como se propõem a fazê-las acontecer.

Participante usa botas "Make America Great Again" na Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC) em Dallas, Texas - Brian Snyder - 4.ago.2022/Reuters

Se você olhar atentamente para a seção de economia do Compromisso com a América, entretanto, poderá ver os tênues esboços de um conjunto familiar de ideias –a 'Reaganomics' zumbi (em referência às políticas econômicas do ex-presidente Ronald Reagan). O que suscita uma pergunta: por que a desregulamentação, cortes de benefícios e isenções fiscais para os ricos ainda são a ideologia dominante de um partido que agora afirma defender a classe trabalhadora?

Antes que eu chegue lá, algumas notas sobre o que a parte econômica do compromisso realmente diz.

Primeiro, é impressionante quantas reclamações econômicas são sobre coisas que quase não são afetadas pela política governamental, como o preço do gás (que caiu muito desde seu pico) e interrupções na cadeia de suprimentos (que vêm diminuindo).

Em segundo lugar, imediatamente depois de declarar que "temos um plano para consertar a economia", os deputados republicanos dizem que "reduzirão os gastos desnecessários do governo". Como qualquer pessoa que acompanha os debates sobre orçamento sabe, essa é a enganação definitiva. De que gastos estamos falando, especificamente?

Tenha em mente que o governo federal é basicamente uma companhia de seguros com um exército: a maior parte dos gastos é com saúde, aposentadoria e militares. Você não pode cortar significativamente os gastos sem atacar pelo menos um deles. Então, que partes desses gastos são um desperdício?

Bem, o senador Rick Scott, presidente do Comitê Nacional Republicano no Senado, pede o encerramento de todos os programas federais –incluindo a Seguridade Social e o Medicare– a cada cinco anos, o que abriria a porta para destruir a rede de segurança social dos Estados Unidos. Outros republicanos tentaram se distanciar dessa ideia, embora sem tirar Scott de seu cargo. Mas, novamente, o que é esse desperdício de gastos que eles se propõem a cortar?

Mas voltemos ao compromisso. Seu programa econômico, tal como é hoje, exige "impostos pró-crescimento e políticas desreguladoras". Não há detalhes, mas isso é claramente um chamado à Reaganomics zumbi.

Por que "zumbi"? Porque agora temos quatro décadas de experiência mostrando que a desregulamentação e os cortes de impostos para os ricos não produzem, de fato, salários mais altos e crescimento econômico mais rápido. Portanto, a ideia de que os cortes de impostos são o segredo da prosperidade deveria estar morta, mas de alguma forma continua se arrastando, comendo cérebros republicanos.

Claro, só estou dizendo isso porque sou marxista. (Não sou, mas é assim que os republicanos modernos chamam qualquer um que apoie impostos progressivos e seguridade social.) Mas os mercados financeiros compartilham meu ceticismo, se é que isso importa. Veja o que está acontecendo na Grã-Bretanha, onde o recente anúncio da primeira-ministra Liz Truss de um plano econômico reaganista fez as taxas de juros subirem e a libra despencar.

O que me traz de volta à minha pergunta original: por que o Partido Republicano ainda está comprometido com uma ideologia econômica fracassada?

Por muito tempo, o partido pareceu se encaixar no famoso retrato desenhado por Thomas Frank em seu livro "What’s the Matter With Kansas?" [Qual é o problema do Kansas?] Ou seja, foi um partido principalmente dedicado a tornar os ricos mais ricos que conseguiu ganhar eleições com questões sociais –o que na prática significava atender ao preconceito durante a campanha e, imediatamente depois, girar para cortes de impostos e benefícios.

Com a ascensão do "Make America Great Again" [Faça a América Grande de Novo, na sigla em inglês], no entanto, atender ao preconceito não é mais um dispositivo de marketing; é a agenda principal do partido. Nesse caso, porém, por que continuar com as políticas favoráveis aos plutocratas? Por que não adicionar algum populismo real à mistura? Por que o deputado Kevin McCarthy, que provavelmente se tornará presidente se os republicanos tomarem a Câmara, declarou que seu primeiro projeto de lei seria revogar as verbas adicionais para a Receita Federal, permitindo que ricos sonegadores de impostos respirassem com facilidade?

Parte da resposta pode ser que os guerreiros antiaborto, anti-LGBTQIA+, anti-imigrantes não sabem ou não se importam muito com a política econômica, por isso a deixaram para os suspeitos de sempre –funcionários do Congresso, pensadores conservadores e outros apparatchiks que passaram suas carreiras inteiras promovendo a mística do corte de impostos.

Mas também pode haver uma estratégia aqui. Os bilionários não podem mais dirigir o Partido Republicano como costumavam fazer, mas o partido ainda quer seu dinheiro. Portanto, políticas favoráveis a plutocratas podem ser uma maneira de manter doadores e corporações ricas a bordo, mesmo que muitos deles se sintam desconfortáveis com a agenda social de direita.

Essa estratégia depende, no entanto, de os eleitores da classe trabalhadora não perceberem o que os republicanos estão fazendo. Daí a natureza vazia do Compromisso com a América; qualquer admissão do que o Partido Republicano realmente pode fazer poderia ser um grande problema político.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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