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PerifaConnection, uma plataforma de disputa de narrativa das periferias. Feita por Raull Santiago, Wesley Teixeira, Salvino Oliveira, Jefferson Barbosa e Thuane Nascimento

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Descrição de chapéu jornalismo

Comunicar é existir para o outro: nós, jornalistas negras e negros, resistimos

Saudamos todos (as) que têm resgatado uma comunicação preta e que têm lado

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Samara Oliveira

Ativista, jornalista favelada do Jardim Catarina (SG), integrante do CCJC (Centro Comunitário do Jardim Catarina), editora do PerifaConnection e repórter no Maré de Notícias

Martihene Oliveira

Jornalista, idealizadora do coletivo de Mídia Independente e Popular Sargento Perifa, atua no Mapa da Mídia Independente e Popular de Pernambuco em parceria com o Marco Zero Conteúdo, também é assessora de imprensa do Sindsprev-PE e autora do Livro-reportagem Urubu Marrom - Relatos de uma jornalista da favela

Etiene Martins

Jornalista, integrante do coletivo de Jornalistas Negros e Negras Lena Santos (MG). Pesquisadora das relações étnico-raciais e doutoranda em comunicação e cultura pela UFRJ

O mito da "democracia racial" pode até parecer inofensivo para quem não o problematiza de forma crítica e não embasa suas reflexões em dados oficiais que comprovam a desigualdade racial no Brasil.

Porém ele sustenta a crença e os argumentos que negam o racismo nas relações pessoais e institucionais na sociedade brasileira.

Essa suposta igualdade faz com que muitas pessoas não estejam atentas às inúmeras expressões racistas utilizadas cotidianamente sem nenhum pudor ou problematização, talvez por acreditarem que a língua é neutra em um país que possui pouco mais de 500 anos, mas que, durante quase quatro séculos, escravizou indígenas, africanos e seus descendentes.

Lena Santos, uma das primeiras jornalistas negras a ocupar uma bancada de jornal no Brasil na década de 60
Lena Santos, uma das primeiras jornalistas negras a ocupar uma bancada de jornal no Brasil na década de 60 - Reprodução

Um país que naturalizou a escravização na maior parte de sua história, e ainda hoje nega que há uma "hierarquização racial", incorporou esse desprezo ao negro também à linguagem.

Muitos desses termos já foram identificados e alguns até ressignificados pelos movimentos negros.
Adjetivos que foram elaborados como pejorativos como são os casos de favelado, marginal e denegrir, hoje são incorporados a linguagem por uma parcela do movimento negro como símbolo de luta e de autoafirmação.

A literatura marginal é um exemplo: Arlindo Cruz cantando "meu nome é favela, é do povo a minha raiz, becos e vielas…"

A compreensão de que "denegrir é tornar negro" e que se "a coisa está preta a coisa tá boa" como canta Rincon Sapiência demonstra a astúcia e a ginga de quem luta por dignidade dessa parcela enorme da população e pela promoção da igualdade racial.

Sabemos que somos o berço da humanidade. Nos debruçamos sobre o que quer nos desumanizar para potencializar nossas vozes e garantir nossos direitos. Transformamos o ataque em grito de guerra, em luta, em nome de coletivos e assim deixamos quem quer nos ferir sem essas armas.

Aliás, assim como o passar do tempo novas estratégias se fizeram para "mascarar o racismo", nós também nos reinventamos dia após dia para "(sobre) viver" numa sociedade que ainda teima em negar suas heranças coloniais, que não nos enxerga enquanto pessoas portadoras de direitos.

Afinal, há diversos estudos que afirmam que a população brasileira reconhece que existe racismo, mas não reconhece que são racistas.

Neste dia 7 de abril, dia do jornalista, saudamos aqui todos (as) os jornalistas pretos (as) que, por memória afetiva ou não, têm resgatado uma comunicação preta e que tem lado.

A comunicação foi ferramenta principal para garantia de direitos da população negra no pós abolição. Eram jornais feitos por pessoas negras, para tratar das suas próprias vivências e mazelas após a Proclamação da República, já que o sonho de serem tratados como cidadãos e não apenas como ex-escravos, com inserção nas escolas, mercado de trabalho, para terem uma vida autônoma, não aconteceu neste contexto.

Portanto, era necessário ter uma imprensa específica para produzir conteúdos sobre e para a população negra. Com isso, trazemos uma reflexão: "Você preto(a) comunicador, jornalista, ainda acha que o jornalismo é branco?"

Vamos continuar dizendo que é uma área que não nos contempla sem entender que o embranquecimento da mídia, assim como toda a sociedade também sofreu o processo de colonização?

Fazer uma comunicação antirracista deveria ser um compromisso de todo jornalista, mas sabemos que, como negros e negras, o velho "tudo o que nós temos somos nós" faz muito sentido na visibilidade da nossa voz.

Não fosse isso, quem iria criticar os jornais policiais, divulgar o racismo incrustado na mídia que estereotipa a favela e faz com que o povo preto assista ao seu próprio genocídio na TV enquanto almoça, com tanta propriedade?

Com esse argumento, afirmamos que a luta por representatividade negra na mídia, seja esta independente ou não, é também por proporcionalidade.

Neste contexto é comum jornalistas negros se encontrarem nas mães solo, relatos de mortes por violência urbana, de intelectualidades relativizadas, entre tantos outros fatores. Independentemente da profissão, status, classe social que se ocupe, nossa cor é um carimbo e isso é fato.

A autonomia e poder que nos são dados, precisa ser entendida por todos os negros e negras que escolheram o caminho das notícias. Somos nós quem contamos a história, enquadramos a notícia e angulamos também. Essa responsabilidade é um caminho que trilhamos ainda com dificuldades, mas que não custa lembrar: foi muito facilitado por quem veio antes de nós. Enquanto comunicadores negros, escolhendo ou não falar sobre isso, é importante lembrarmos dessa trajetória que nos possibilita inclusive ter o direito da escolha.

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