Dois anos e meio depois de tomar o mundo de roldão, o vírus da Covid-19 vai se enfraquecendo graças a uma combinação de vacinas e imunidade de grupo, e a vida vai, ao menos em alguma medida, voltando ao normal. Mas lembrar e documentar é importante, pois a memória é volúvel e, em época de eleição, mentiras e verdades se misturam com uma facilidade inacreditável.
Afinal, como se saiu o Brasil durante a pandemia?
A estatística comumente empregada para responder a essa pergunta é a quantidade de pessoas mortas por Covid-19 a cada 1 milhão de habitantes –ou outra proporção, como mortes por 100 mil. Dados compilados pela Johns Hopkins University nos colocam nas primeiras posições no quesito mortos por Covid-19 por milhão de habitantes. Dos cerca de 130 países com mais de 2 milhões habitantes presentes na amostra, o Brasil aparece em décimo segundo lugar.
No entanto, essa medida nua e crua é problemática. O número de mortes por milhão no Brasil não difere muito do verificado na Itália. Mas, visto que a população de idosos lá (como proporção da total) é quase o dobro da brasileira, a comparação é torta e "injusta" com a Itália –a Covid-19 mata muito mais idosos do que jovens, independentemente da agilidade da resposta da política pública.
Para corrigir essa distorção, uma medida mais apropriada é o número de mortes esperadas para cada um dos países com base em sua estrutura etária. O Japão, por exemplo, testemunhou muito menos mortes do que sugeriria sua distribuição etária. Essa é claramente uma medida do sucesso desse país no enfrentamento da pandemia.
Usando esse critério, o Brasil vai para a oitava posição, basicamente empatado com o Paraguai. Uma análise mais detalhada, incluindo também outras variáveis como população urbana e renda per capita pinta um quadro similar. O país, e outros na América Latina e no Leste Europeu, foi mais afetado pela Covid-19 do que indicadores fora do controle do governo sugeririam ser o caso. A política pública, portanto, não foi boa.
E como nos saímos na vacinação, uma dimensão importante da política pública? Relativamente bem, perto da média mundial, com pouco mais da metade da população adulta tendo recebido 3 doses de acordo com os dados de setembro de 2022. O problema aqui, e isso possivelmente ajuda a explicar o porquê de tantas mortes, é a dinâmica temporal da vacinação. No começo do corrente ano, o total de pessoas com três doses no braço era relativamente baixo em comparação com outros países. A convergência para a média ocorreu, mas tardiamente.
Outra possibilidade é a de que o país, em média, se enclausurou menos, e teve assim mais mortes, mas com menores custos para a economia. Dados de PIB por habitante do Banco Mundial mostram que a retomada, após a queda de 2020, foi próxima à média mundial.
Em resumo, nos anos de pandemia, o Brasil foi bem ruim em termos de mortes por habitantes, e alcançou posição média em termos de desempenho econômico.
Esses são os dados. Podemos discutir as causas, mas não os números.
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