A crise climática saiu do seu cantinho nos editoriais de ciência e meio ambiente, conquistou espaço nas principais manchetes e lá deve ficar por um bom tempo. Tem notícia (tipicamente ruim) para todos os gostos: aos que se interessam por dados, novos recordes de séries históricas, como a semana mais quente já registrada na Terra; para os que são sensíveis às questões sociais, projeções sinistras sobre a escala do sofrimento humano associado à crise; até para aqueles que só falam a língua dos mercados, números assombrosos da conta que o mundo terá de pagar. A realidade escancara a gravidade e a urgência da crise.
Nesse cenário, não basta que a ação climática seja rápida. É imperativo que seja também efetiva. Afinal, se estamos correndo contra o tempo ao tentar assegurar condições menos calamitosas para a vida no planeta, não faz nenhum sentido gastar recursos com esforços que não funcionam. Ainda mais quando se trata de recursos sabidamente escassos –dinheiro, trabalho qualificado, capital político e, claro, o próprio tempo.
A afirmação pode até ser óbvia, mas carrega uma implicação crucial: precisamos saber o que de fato funciona e usar essa informação para decidir como alocar os recursos para potencializar seu impacto. Em linguagem mais elegante: precisamos de ação climática baseada em evidência. Pode soar fácil, mas não é.
Determinar a efetividade de uma ação (um programa, uma política, um projeto filantrópico) exige método e rigor técnico. Primeiro, é preciso deixar claro qual é o objetivo pretendido: proteger vegetação nativa ou gerar emprego e renda para populações locais? Claro que um mesmo esforço pode ter diversos objetivos, não raro complementares. Mas é essencial tê-los bem definidos, a fim de que possamos avaliar a efetividade da ação para o cumprimento de cada um.
Uma vez claros os objetivos, temos de entender os mecanismos por meio dos quais a ação potencialmente alcança seu objetivo. Idealmente, queremos saber não apenas se algo funcionou, mas também porque funcionou ou deixou de funcionar. Precisamos, portanto, de indicadores e métricas que tornem tanto os objetivos quanto os mecanismos de uma ação visíveis, quantificáveis, passíveis de acompanhamento. Às vezes, esses indicadores e métricas já existem, às vezes precisam ser construídos do zero.
O próximo passo –e esse é um passo enorme– requer efetivamente transformar a informação de indicadores e métricas em evidências rigorosas sobre os efeitos da ação. Há diversas formas de fazer isso, mas nenhuma universalmente adequada. Aqui, analistas, técnicos e pesquisadores colaboram com os detentores de conhecimento específico sobre o contexto no qual a ação aconteceu para identificar a forma que melhor se adequa àquele caso particular. Além de avaliar se e como a ação alcançou seus objetivos, podem também investigar suas possíveis limitações e efeitos adversos. Esse conjunto de evidências constitui a base para a decisão sobre o futuro da ação. Manter e mesmo aprimorar as que funcionam, mas eliminar aquelas que se mostraram inefetivas. É duro, mas necessário.
Vale destacar que a economia oferece um instrumental poderoso para isso. Não é a imagem que as pessoas tipicamente têm dos economistas, mas muitos deles (eu, inclusive!) trabalham justamente para gerar evidência robusta sobre o impacto e a efetividade de políticas, programas e intervenções. A cultura da decisão baseada em evidência é relativamente nova no Brasil, principalmente na área de políticas públicas, tão centrais para a ação climática, mas já avançamos bastante. Existe hoje, por exemplo, uma Secretaria de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas e Assuntos Econômicos dentro do Ministério do Planejamento e Orçamento.
Como alguém que atua há mais de uma década para promover a política climática baseada em evidência no Brasil, adoraria dizer que a evidência rigorosa fala por si só... Mas isso está longe de ser verdade. Há, portanto, uma última etapa absolutamente crucial. Para que a evidência seja útil, precisa ser comunicada –ampla e claramente. Com isso, ela serve tanto como embasamento para os tomadores de decisão quanto como insumo crítico para a construção de mecanismos de transparência social e de responsabilização daqueles que ocupam posições com poder de decisão.
Sim, formuladores e executores das ações climáticas precisam saber quais delas funcionam. Mas o público também precisa. E rápido.
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