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A tal da decisão baseada em evidência

Determinar a efetividade de uma ação para enfrentar a crise climática exige método e rigor técnico

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Clarissa Gandour

Doutora em economia pela PUC-Rio e especialista em políticas públicas para enfrentamento da crise climática. Sua pesquisa apoia a tomada de decisão baseada em evidência

A crise climática saiu do seu cantinho nos editoriais de ciência e meio ambiente, conquistou espaço nas principais manchetes e lá deve ficar por um bom tempo. Tem notícia (tipicamente ruim) para todos os gostos: aos que se interessam por dados, novos recordes de séries históricas, como a semana mais quente já registrada na Terra; para os que são sensíveis às questões sociais, projeções sinistras sobre a escala do sofrimento humano associado à crise; até para aqueles que só falam a língua dos mercados, números assombrosos da conta que o mundo terá de pagar. A realidade escancara a gravidade e a urgência da crise.

Nesse cenário, não basta que a ação climática seja rápida. É imperativo que seja também efetiva. Afinal, se estamos correndo contra o tempo ao tentar assegurar condições menos calamitosas para a vida no planeta, não faz nenhum sentido gastar recursos com esforços que não funcionam. Ainda mais quando se trata de recursos sabidamente escassos –dinheiro, trabalho qualificado, capital político e, claro, o próprio tempo.

A afirmação pode até ser óbvia, mas carrega uma implicação crucial: precisamos saber o que de fato funciona e usar essa informação para decidir como alocar os recursos para potencializar seu impacto. Em linguagem mais elegante: precisamos de ação climática baseada em evidência. Pode soar fácil, mas não é.

Bombeiros atuam no rescaldo de incêndio em Sesklo, na região central da Grécia
Bombeiros atuam no rescaldo de incêndio em Sesklo, na região central da Grécia - Alexandros Avramidis - 26.jul.23/Reuters

Determinar a efetividade de uma ação (um programa, uma política, um projeto filantrópico) exige método e rigor técnico. Primeiro, é preciso deixar claro qual é o objetivo pretendido: proteger vegetação nativa ou gerar emprego e renda para populações locais? Claro que um mesmo esforço pode ter diversos objetivos, não raro complementares. Mas é essencial tê-los bem definidos, a fim de que possamos avaliar a efetividade da ação para o cumprimento de cada um.

Uma vez claros os objetivos, temos de entender os mecanismos por meio dos quais a ação potencialmente alcança seu objetivo. Idealmente, queremos saber não apenas se algo funcionou, mas também porque funcionou ou deixou de funcionar. Precisamos, portanto, de indicadores e métricas que tornem tanto os objetivos quanto os mecanismos de uma ação visíveis, quantificáveis, passíveis de acompanhamento. Às vezes, esses indicadores e métricas já existem, às vezes precisam ser construídos do zero.

O próximo passo –e esse é um passo enorme– requer efetivamente transformar a informação de indicadores e métricas em evidências rigorosas sobre os efeitos da ação. Há diversas formas de fazer isso, mas nenhuma universalmente adequada. Aqui, analistas, técnicos e pesquisadores colaboram com os detentores de conhecimento específico sobre o contexto no qual a ação aconteceu para identificar a forma que melhor se adequa àquele caso particular. Além de avaliar se e como a ação alcançou seus objetivos, podem também investigar suas possíveis limitações e efeitos adversos. Esse conjunto de evidências constitui a base para a decisão sobre o futuro da ação. Manter e mesmo aprimorar as que funcionam, mas eliminar aquelas que se mostraram inefetivas. É duro, mas necessário.

Vale destacar que a economia oferece um instrumental poderoso para isso. Não é a imagem que as pessoas tipicamente têm dos economistas, mas muitos deles (eu, inclusive!) trabalham justamente para gerar evidência robusta sobre o impacto e a efetividade de políticas, programas e intervenções. A cultura da decisão baseada em evidência é relativamente nova no Brasil, principalmente na área de políticas públicas, tão centrais para a ação climática, mas já avançamos bastante. Existe hoje, por exemplo, uma Secretaria de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas e Assuntos Econômicos dentro do Ministério do Planejamento e Orçamento.

Como alguém que atua há mais de uma década para promover a política climática baseada em evidência no Brasil, adoraria dizer que a evidência rigorosa fala por si só... Mas isso está longe de ser verdade. Há, portanto, uma última etapa absolutamente crucial. Para que a evidência seja útil, precisa ser comunicada –ampla e claramente. Com isso, ela serve tanto como embasamento para os tomadores de decisão quanto como insumo crítico para a construção de mecanismos de transparência social e de responsabilização daqueles que ocupam posições com poder de decisão.

Sim, formuladores e executores das ações climáticas precisam saber quais delas funcionam. Mas o público também precisa. E rápido.

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