A semana que passou foi dura demais.
Acompanhei lideranças da Cufa nas ações de apoio às cidades de Embu e Franco da Rocha (SP), atingidas pelas fortes chuvas, e conversei com pessoas que perderam parentes, pertences e tiveram a vida toda levada, literalmente, por água abaixo.
Vi os mesmos cenários em Minas Gerais, na Bahia, no Tocantins, no Piauí, no Maranhão e em Goiás. Parte da população deste país está entregue à própria sorte, contando apenas com a solidariedade de organizações e voluntários, que, em parceria com empresas, realizam ações para amenizar a dor e os impactos das inundações.
As chuvas atingiram as mesmas pessoas e as mesmas áreas de sempre, por isso me recuso a chamar esses acontecimentos de acidente ou de catástrofe. Foi uma tragédia anunciada. Mesmo assim não vemos por parte dos governos planos habitacionais para realocar essas pessoas em moradias seguras, onde haja equilíbrio entre qualidade de vida, meio ambiente e uma vida social de vivência e trabalho.
No meio disso tudo, temos o assassinato violento de Moïse Mugenyi Kabagambe, congolês que chegou ao Brasil ainda criança.
Foi amarrado e brutalmente e assassinado na cidade do Rio de Janeiro por vários homens, por cobrar diárias de trabalho. Restou-nos a rua como espaço para protestar, cobrar as autoridades, exigir justiça e honrar o legado de um dos nossos. Kabagambe saiu do seu país fugindo das guerras e veio tombar vítima da guerra diária que a população preta vive neste país.
Mal choramos a partida precoce de Moïse e somos surpreendidos com o assassinato de Durval Teófilo Filho, atingido por três tiros por um sargento da Marinha. O militar alegou ter confundido Durval com bandidos.
Somos exilados de direitos no nosso país e perseguidos como inimigos. O cenário inviabiliza qualquer ideia de nação, já que, devido à cor da pele, somos privados de direitos básicos. E corremos riscos, pois o imaginário popular está habitado com a ideia de preto como perigoso. Nossas vidas são meros números em estatísticas.
Essas são marcas de um racismo de tipo brasileiro, que está entranhado nas relações sociais, econômicas e institucionais e nos empurra para um dilema: ou o Brasil refaz seus pactos de convivência para inserir a todos ou isso aqui vai explodir.
Não podemos chamar de país um lugar cheio de desigualdades e racismo. Ou se dividem riquezas e oportunidades, ou essa tragédia vai transbordar.
A sorte é que ainda queremos somente justiça, por inteiro, não pela metade.
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