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Jornalista e autor de "Escola Brasileira de Futebol". Cobriu sete Copas e nove finais de Champions.

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Política pesou na escolha e Felipão volta a ter um desafio no Palmeiras

Contratação ousada, técnico volta ao time que conquistou títulos sob o fantasma do 7 a 1

Felipão vibrou ao receber o convite do Palmeiras e disse: “Estou indo com gana”. Parece óbvio, mas é contraste com o que aconteceu em sua última passagem pelo Grêmio.

Os dirigentes que conviveram com ele, em Porto Alegre, julgam que o trabalho foi prejudicado porque Felipão estava triste, logo depois do 7 a 1. O relacionamento com os jogadores não foi bom.

O Grêmio ficou em sétimo lugar no Brasileiro de 2014 e Felipão pediu demissão para ir à China em maio do ano seguinte. Do ponto de vista político, a decisão do Palmeiras de contratar Scolari foi brilhante.

Campeonato não se ganha com política, mas o ambiente palmeirense atrapalha muito. Nos últimos 90 dias, o presidente Maurício Galiotte ouviu 180 vezes que era preciso tirar Roger Machado e contratar um treinador experiente.

Na terça-feira (24), Alexandre Mattos disse que blindava e cobrava o treinador e deu a entender que não o demitiria. A intenção não era mesmo trocar.

A pressão política pesou, num clube dividido em quatro facções: o presidente, a patrocinadora, os amigos da Crefisa e os inimigos dela.

Se alguém se esqueceu, vale lembrar: alguém tem de pensar no Palmeiras.

Nesse cenário, na mesma noite da derrota para o Fluminense, a três meses da eleição do clube, Galiotte foi rápido.

Apontou para a suposta falta de liderança de Roger Machado e apostou as fichas na maior grife entre os treinadores palmeirenses: Felipão. É um antigo vício do Palmeiras olhar para o passado para apostar no futuro. Contratar Valdivia, Vagner Love, trazer de volta Cuca, Luxemburgo...

Mas é ousada a contratação, porque o novo dicionário do futebol cola os dígitos 7 a 1 ao lado do verbete Felipão.

A decisão é tão corajosa quanto é covarde dar como sinônimo de Felipão apenas a derrota para a Alemanha. Ele também é campeão do mundo e o único treinador brasileiro, junto com Zagallo, a alcançar as semifinais em três Copas disputadas —de outras nacionalidades, só o alemão Helmut Schön.

Os dirigentes do Grêmio de 2014/15 rejeitam chamar Felipão de ultrapassado. Dizem que não está, apesar de ter trabalhado abaixo de seu potencial naquele momento, pós Copa-2014.

Taticamente, Felipão não está ultrapassado. Basta ver o teipe de seu Guanzhou Evergrande, campeão da Liga dos Campeões da Ásia, na vitória sobre o América do México, no Mundial de Clubes de 2015. Era compacto, como se joga hoje.

Seus times nunca brilharam pela troca de passes. A França, campeã mundial, foi a 16ª nesse critério.

Em sua melhor fase, Felipão não era só um motivador. Foi tático também.

Mas a mais difícil atualização, hoje em dia, está no vestiário. Saber falar o idioma dos boleiros ricos e que só largam o WhatsApp na hora de dar um chute.

Em sua vitoriosa carreira, Felipão falou a língua da bola no Kuait, na Arábia Saudita, no Japão, na China, em Portugal e no Uzbequistão.

Não se comunicou no Chelsea, não pela dificuldade no inglês, mas pela ruptura com o grupo de Drogba.

Os jogadores mudaram. Estão mais cultos e contestadores. Se a conversa não acontecer no tom certo, se o convencimento não chegar com o trabalho do dia a dia, não tem liderança nem trabalho tático que funcione.

É impossível dizer se Scolari vai dar certo. É certo dizer que lidar com esse novo vestiário exige paciência, artigo de luxo para homens comuns de 69 anos. Em sua trajetória de vida, Felipão não foi um homem comum.

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