Reinaldo José Lopes

Jornalista especializado em biologia e arqueologia, autor de "1499: O Brasil Antes de Cabral".

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Reinaldo José Lopes

Pequenos grandes gigantes

Mamíferos gigantes e minúsculos que evoluíram em ilhas são igualmente vulneráveis a extinções, diz estudo

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Como sonhar não custa nada nem tampouco viola as leis da física, confesso que volta e meia atualizo uma lista de épocas (e lugares) que gostaria de visitar encarapitado numa máquina do tempo. Morro de vontade de dar uma passadinha na Sicília de meio milhão de anos atrás, por exemplo, exclusivamente para coçar as orelhas de um Palaeoloxodon falconeri. Trata-se de um dos menores elefantes de todos os tempos, anatomicamente parecidíssimo com seus parentes de hoje —mas medindo apenas 1 m de altura (ou uns 80 cm, no caso das fêmeas). Que coisa fofa.

O pequenino P. falconeri me maravilha, além de tudo, porque não é nem de longe um caso isolado. O Mediterrâneo do Pleistoceno (a Era do Gelo) estava coalhado de diferentes espécies de elefantes-anões, que se espalhavam por ilhas como Malta, a Sardenha, Chipre, Creta e os arquipélagos gregos do Dodecaneso e das Cíclades.

Palaeoloxodon falconeri, um dos menores elefantes de todos os tempos, no Museu de História Natural de Milão, na Itália - Stefano Stabile/Wikimedia Commons

Acontece que a coisa não termina no Mediterrâneo, nem se restringe aos elefantes. A vida nas ilhas é capaz de operar dois truques aparentemente opostos —mas, na verdade, complementares— no processo evolutivo de mamíferos e outros animais. Conhecemos muitíssimos casos de nanismo insular, mas também de gigantismo insular, com bichos que se tornam tanto muito menores quanto muito maiores do que esperaríamos para os membros de sua linhagem.

Ambos os fenômenos são, no fundo, respostas ligeiramente diferentes às mesmas limitações e oportunidades ambientais que só uma ilha proporciona. De um lado, ilhas costumam ser muito, muito menores que um continente, o que corresponde, sendo iguais todos os demais fatores, a uma menor disponibilidade de recursos alimentares, entre outras coisas.

Por outro lado, como as ilhas em geral abrigam uma diversidade menor de espécies que o continente, além de estarem cercadas por uma barreira difícil de atravessar —um negócio chamado "mar", sabe como é—, não é incomum que uma espécie recém-chegada ao ambiente insular se veja brindada com uma ausência quase completa de competidores e predadores. De repente, aquele mundinho é só dela.

O resultado é que, em diversos casos, animais de porte pequeno podem ficar muito maiores do que seriam normalmente em solo continental (daí o fato de que há diversos roedores gigantes em ilhas, por exemplo). Ao mesmo tempo, animais grandalhões podem se miniaturizar porque 1) não precisam continuar tão enormes, já que não há predadores, e 2) desse jeito eles não precisam de tanto alimento assim no ambiente limitado das ilhas —o que explica o passo evolutivo dos nossos elefantinhos.

O problema, claro, é o que acontece quando o isolamento é quebrado. Como mostra um estudo recente no periódico Science, assinado por Roberto Rozzi, da Universidade Martinho Lutero de Halle-Wittenberg, na Alemanha, nanicos e gigantes das ilhas são especialmente vulneráveis à chegada de invasores.

Afinal, três quartos das extinções de espécies terrestres que se deram de 1500 para cá aconteceram em ilhas. O que Rozzi e seus colegas mostraram é que esse risco é especialmente alto nos casos mais extremos, quando mamíferos atingiram os níveis mais altos de gigantismo ou de nanismo.

E a coisa piorou muito quando os seres humanos começaram a colonizar essas ilhas —com um aumento de mais de dez vezes nas taxas normais de extinção. Isso faz com que a biodiversidade que resiste nesses ambientes se torne ainda mais preciosa e digna de cuidado, mesmo que ela não pareça tão mágica quanto um elefantinho de bolso.

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