Reinaldo José Lopes

Jornalista especializado em biologia e arqueologia, autor de "1499: O Brasil Antes de Cabral".

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Reinaldo José Lopes

ET não sabe estacionar

ETs já pisaram na Terra? Um guia cético para declarações de militar no Congresso americano

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É reconfortante saber que até seres capazes de atravessar os oceanos cósmicos rumo à Terra são, "mutatis mutandis", tão incapazes de fazer uma baliza quanto eu, que reprovei no meu primeiro exame na autoescola (e ainda arranquei o espelhinho do retrovisor sem querer tentando ajeitá-lo).

OK, pousar em segurança por aqui depois de uma viagem interplanetária talvez seja um pouco mais complicado do que fazer baliza. Mas certamente parece a parte mais fácil do processo. Uma etapa na qual, a julgar pelo que disse um ex-militar ao Congresso dos EUA nesta semana, os extraterrestres andam derrapando há décadas, esborrachando-se na superfície deste planeta e deixando para trás cacos tecnológicos e biológicos, supostamente guardados a sete chaves.

O ex-militar David Grusch fala aos congressistas americanos
David Grusch jura que fornecerá aos congressistas americanos informações sobre os ETs; confesso que tudo o que fiquei sabendo sobre ele até agora faz meus detectores de bobajada apitarem - Brendan Smialowski/AFP

O ex-militar em questão, David Grusch, jura de pé junto que fornecerá aos congressistas americanos — em audiências reservadas — informações sobre como verificar o que ele está dizendo. Confesso que tudo o que fiquei sabendo sobre o sujeito até agora faz meus detectores de bobajada apitarem sem parar (em entrevistas, ele chegou a enfiar até o Vaticano e o papa Pio 12 na tal campanha de ocultação de ETs que estaria em curso desde o começo do século passado). Seja como for, convido quem me lê a fazer um esforço de imaginação cientificamente informada acerca do que diz Grusch.

Comecemos com a afirmação de que os corpos de "pilotos" das tais naves estão em algum freezer por aí. Se por acaso aparecerem fotos dos defuntos em algum momento, eu ficarei quase totalmente convencido de uma farsa caso a anatomia deles inclua uma cabeça (grandalhona), um tronco e quatro membros, por exemplo. Ou se eles forem suspeitamente parecidos com qualquer animal da Terra.

Digo isso porque me parece muito, muito improvável que a trajetória da evolução num planeta distante, com condições ambientais significativamente diferentes das nossas, produza algo reconhecível como "um mamífero", "um inseto" ou mesmo "uma água-viva". Um ET plausível precisa ser mais surpreendente do que isso, por mais que convergências da biologia em escala galáctica possam acontecer.

Um segundo detalhe que me fez cofiar os bigodes foi a ideia de que "arranjos atômicos únicos" estão presentes na estrutura física das naves espatifadas. A nossa espécie pode não ser capaz de viajar por distâncias interestelares, mas já conhecemos bastante bem os elementos químicos e os "arranjos atômicos" formados por eles, tanto na Terra quanto em condições extremas, como o núcleo das estrelas.

Essas possibilidades são governadas por leis que já elucidamos. Isso significa que não faz muito sentido esperar que alienígenas consigam fazer seu Lego de átomos de alguma maneira que fuja totalmente do que já sabemos. As leis da física e da química são as mesmas no Universo inteiro, e não há razão para achar que ETs são capazes de violá-las apenas por ser ETs.

Voltemos, por fim, à afirmação central de Grusch: a de que acidentes com essas naves aconteceram várias vezes do século 20 para cá, em diversos lugares do mundo. A não ser que as medidas de segurança desses veículos sejam comparáveis às das caravelas do século 16, isso significa que muitíssimas outras visitas aconteceram também (as que não se esborracharam no deserto, no caso).

É realmente razoável imaginar que, diante dessa abundância de visitas, nenhuma informação confiável jamais viria a público e teríamos de nos contentar com boatos, lendas urbanas e telefone sem fio?

Diante do desconhecido, é claro que vale a pena manter a cabeça aberta. Mas, de preferência, não tão aberta a ponto de o cérebro acabar caindo para fora dela.

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