Ricardo Araújo Pereira

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

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Ricardo Araújo Pereira

Como reconhecer o fim do mundo

Satélite transmite extração de pus de um senhor residente em Oklahoma

Desde que Donald Trump é presidente dos Estados Unidos, a vida ganhou um novo encanto. Há uma sensação de fim do mundo que faz com que a gente dê mais valor às coisas.

A comida parece ter sabor melhor. Será que esta é a última feijoada que eu como? A natureza está mais viva. Como se chama esta árvore em que nunca tinha reparado, aquela flor que cresce milagrosamente entre duas pedras? Tudo é mais bonito, e mais interessante.

Há apenas um aspecto que desmente a hipótese de que o mundo se encaminha rapidamente para o fim: a intensa onda de libertinagem que me prometeram, afinal, não se verifica. Se é para isso, não vale a pena o mundo acabar.

O livro do Apocalipse não ajuda a compreender o momento, na medida em que fala do aparecimento de uma besta (e eu vejo várias), e refere a existência de uma grande prostituta da Babilônia (que, com pena minha, não apareceu).

"Os habitantes da Terra se embriagaram com o vinho da fornicação", diz a Bíblia —e, no entanto, todos os dias, nas melhores adegas, garantem-me que ainda não chegou nada.

Ilustração
Luiza Pannunzio/Folhapress

No entanto, no mês passado tive a confirmação de que o planeta não durará muito mais. Um canal de televisão americano começou a exibir o programa Dr. Pimple Popper, que traduziríamos em português, se fôssemos forçados a isso, por Doutora Espreme-Espinhas.

É protagonizado por Sandra Lee, uma dermatologista que tinha um canal de YouTube em que espremia erupções cutâneas. O canal dava alegria a milhões de seguidores, e a estação TLC teve a ideia de lhe oferecer palco televisivo.

Equipamento que custa milhões de reais foi então colocado ao serviço da remoção de sebo de poros entupidos.

Milagres tecnológicos como câmeras de alta definição captam imagens, que depois enviam para um satélite, que por sua vez as transmite, permitindo a espectadores de todo o mundo assistirem à extração de pus do cachaço de um senhor residente em Oklahoma.

Satélite e pus, os dois extremos da criação humana. Já foram emitidos três episódios: A Encantadora de Lipomas, O Maior Caroço do Mundo e O Cisto Persiste.

Posto isto, parece-me que é o fim. Que venha depressa o vinho da fornicação, porque já esgotei o vinho normal a tentar esquecer a Doutora Espreme-Espinhas.

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