Senhoras e senhores membros do júri, apresento-vos o réu. Muitos de nós nunca ouvíramos falar dele antes de 2020.
É o pangolim. Não parece um animal belicoso, mas o certo é que está coberto por uma armadura. Devíamos ter desconfiado, diz a acusação.
A natureza parece tê-lo em alta conta, tanto que o dotou de um sistema de defesa inexpugnável, à semelhança do que fez com o ouriço-terrestre, que também ninguém sabe por que razão está guardado por centenas de aguçados espinhos.
Que predadores estariam tão interessados naquela espécie de rato? E por que outros bichos igualmente insignificantes não desfrutam da mesma proteção? É difícil explicar.
Com o pangolim sucede o mesmo. Mas a sua escamosa carapaça não o protegeu contra a calúnia. Desde cedo, o pangolim foi apresentado como o principal suspeito pela transmissão do vírus SARS-CoV-2 aos seres humanos.
As provas, a existirem, eram meramente circunstanciais ou até forjadas. Os testes iniciais, segundo os quais o vírus responsável pela pandemia tinha sido encontrado em pangolins, estavam errados.
O sequenciamento genético do vírus presente nos pangolins revelou que ele partilhava com o vírus registrado no ser humano apenas 90,3% do DNA, e só um valor de 99,8% permite afirmar com segurança que as mutações estão relacionadas. Parece óbvio que era preciso encontrar um culpado, e o pangolim estava no lugar errado à hora errada.
Um relatório do FBI diz que a pandemia surgiu, provavelmente, de um vazamento de um laboratório chinês.
Mas eu recordo, senhoras e senhores, que entre fevereiro e maio de 2021 o Facebook ordenou que fossem banidos todos os posts que pusessem a hipótese de a Covid-19 ter resultado de uma fuga laboratorial.
Ao longo de três meses, o sr. Zuckerberg decidiu o que era verdade e mentira, esforçando-se para apagar opiniões que pudessem ser favoráveis ao meu constituinte.
Em fevereiro, a hipótese da inocência do pangolim era uma teoria da conspiração falsa e nociva. Em maio, já tinha se tornado uma ideia que merecia ser discutida. Agora é entendida não só como plausível, mas até como provável por organismos governamentais. Mas quem devolve ao pangolim o seu prestígio original? Quem que irá reparar os danos que a sua honorabilidade sofreu?
Está nas vossas mãos corrigir uma injustiça e impedir que isto volte a acontecer.
Hoje foi o pangolim, amanhã pode ser o tamanduá.
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