Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Rodrigo Zeidan
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O Brasil e a Nova Rota da Seda

País tem mais com o que se preocupar que aderir à iniciativa chinesa

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Recentemente, a Itália saiu da Nova Rota da Seda, acordo da China com países interessados em aumentar investimentos de Pequim. Já me perguntaram várias vezes, por morar na China, se o Brasil deveria fazer parte desse acordo. A resposta, em bom português, é que não faz diferença.

A Nova Rota da Seda é muito menor do que já foi no passado e hoje funciona mais para emprestar dinheiro para empresas chinesas fazerem obras de infraestrutura em países pobres e de renda média do que qualquer outra coisa.

A ideia da China como grande investidor (ou colonizador, segundo alguns) na África ou na América Latina foi por água abaixo. Primeiro, pelo ataque especulativo contra o yuan pelas estatais chinesas. Depois, pelas tensões geopolíticas, por problemas com dívidas para países amigos e pela desaceleração da economia chinesa.

Em 2013, quando a iniciativa foi criada (então chamada de "One Belt One Road"), as autoridades monetárias chinesas lutavam para expulsar dólares do seu país. No auge da acumulação de reservas cambiais, em 2013 e 2014, o saldo líquido de entrada de dólares na China chegava a US$ 100 bilhões por mês. Sim, por mês, não por ano. Algo que não só era único na história da humanidade —nunca um país recebeu tantos recursos em tão pouco tempo— como parecia que nunca acabaria, pois a economia chinesa era o motor do desenvolvimento mundial.

O Brasil também já passou por algo parecido em 2007 e no início de 2008, quando o Banco Central lutava a todo custo para não deixar o real se valorizar ainda mais; muitos achavam que o real voltaria à paridade com o dólar, mas aí veio a crise financeira global e desvalorizou a moeda brasileira.

O projeto da Nova Rota da Seda
O projeto da Nova Rota da Seda - William Mur/Folhapress

No caso chinês, com a enxurrada de dólares, fazia sentido uma estratégia de "comprar" aliados com projetos gigantescos de infraestrutura ou, em última instância, fazer empréstimos emergenciais para países em dificuldade. Saiu mais de US$ 1 trilhão da economia chinesa desde o início da Nova Rota da Seda, mas grande parte nos primeiros anos, quando as reservas do país bateram em US$ 4 trilhões.

Mas tudo isso muda em 2015 e 2016, quando empresas estatais chinesas apostaram que o Banco Central não iria conseguir manter a cotação vigente do yuan com o dólar e chegaram a tirar quase US$ 1 trilhão da economia do país em um ano e meio.

No caso italiano, entraram na contabilidade da Nova Rota da Seda projetos superprioritários (com ironia), como a compra de participação nos clube de futebol Milan e Inter de Milão.

A China também não está "comprando" a África (e só alguém muito elitista pode reclamar de projetos de investimentos em países que carecem de infraestrutura básica). O número de trabalhadores chineses no continente caiu 64% desde o auge do programa, em 2015.

Hoje, os projetos da Nova Rota da Seda são pequenos e direcionados, em grande parte, a energias limpas. Mas estar ou não no projeto não faz muita diferença. Se há interesse de empresas chinesas ou do governo, há financiamento dos projetos.

O que o Brasil ganharia assinando o protocolo? Quase nada. O que perderia? Também quase nada. Os EUA torceriam o nariz, e a China poderia adicionar mais um país à sua coleção de 150 que aderiram ao acordo, mas, fora isso, não mudaria muita coisa.

Há coisas mais importantes para nos preocupar do que com a Rota da Seda. Ela nunca passou pelas Américas, afinal.

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