Todas as profissões podem ser maravilhosas, cada qual com suas características. Por acaso, trabalhei a vida toda com as palavras e nunca pensei em outra coisa. Mas um ofício que me fascina e tento acompanhar à distância é o do biólogo. É aquele que, não importa a especialidade, trata sempre de uma forma de vida, com o objetivo de estudá-la, protegê-la, salvá-la —nem que esta vida seja eventualmente sacrificada para salvar outras.
Assim como qualquer profissional, os biólogos às vezes levam serviço para fazer em casa depois do expediente. E, nesse caso, não se trata de planilhas ou balancetes chatos para decifrar, mas gaiolas com hamsters, camundongos ou coisa assim. Os filhos dos biólogos, pela frequência com que visitam os pais no trabalho —o laboratório—, acostumam-se a conviver com cobras, lagartos e insetos, e até aprendem a amá-los.
Sei disso porque tenho uma filha, Pilar, bióloga, e minhas netas Isabel, Olivia e Aurora cresceram convivendo com esses bichos —Isabel, em criança, queria ter uma tarântula de estimação. Por extensão, acabei também me afeiçoando a eles e livrei-me do preconceito que os aponta como seres nojentos, perigosos, que se deve matar à primeira vista. Sei que não se pode confiar numa jararaca ou num escorpião —mas também não se pode confiar em certos humanos, principalmente os que, como os políticos e os moralistas, se arvoram a decidir ou falar por nós.
Há dias, Pilar, que está morando no Nordeste, encontrou um jaboti que tentava atravessar a rua. O asfalto não é um ambiente propício para jabotis. Pilar levou-o para casa e o depositou em sua horta, onde ele teria comida e conforto até ser entregue à autoridade competente. Antes disso, para sua surpresa, o jaboti —na verdade, uma jaboti— presenteou-a com um ovo.
O ovo se abriu. Com o que acabo de me tornar o feliz bisavô de um bebê-jaboti.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.