Não é todo dia que uma palavra do vocabulário comum chega ao centro do palco político, como está acontecendo neste momento na corrida presidencial americana com o adjetivo "weird" (esquisito, estranho).
A campanha da candidata democrata, Kamala Harris, começou há dias —tudo indica que de forma orquestrada– a chamar repetidamente de "weird" seus oponentes, tanto Donald Trump quanto o candidato a vice na chapa republicana, o senador J.D. Vance.
Consta que o pai do achado é o governador de Minnesota, Tim Walz, que já o vinha empregando há meses contra os republicanos. O fato de Walz ter sido anunciado na terça (6) como vice na chapa de Kamala sugere no mínimo uma nova sintonia político-linguística entre os democratas.
Há sinais de que o golpe foi sentido. "Esquisito é você", os republicanos começaram a revidar, magoados, no melhor estilo de bate-boca infantojuvenil que a acusação parece suscitar.
Trump Jr. tuitou na semana passada: "Sabe o que é esquisito de verdade? Políticos lenientes com o crime como Kamala deixarem imigrantes ilegais saírem da prisão para atacar americanos".
Muitos observadores têm apontado que a estratégia "weird", por mais rasa que possa ser considerada do ponto de vista do debate de propostas, conseguiu a proeza de deixar na defensiva uma turma que passou anos abusando de insultos típicos da quinta série para seduzir os eleitores americanos.
A novidade vem dividindo os analistas. Na página de opinião do jornal The New York Times, enfrentaram-se na semana passada dois artigos opostos em tudo, menos na intensidade.
Jessica Bennett, que se encantou com a simplicidade despretensiosa do adjetivo, invocou a autoridade do linguista George Lakoff para caracterizá-lo como "um ataque que esconde ser um ataque".
Já o de Thomas Friedman, que alerta para o risco de arrependimento dos democratas, recorreu ao filósofo Michael Sandel, para quem o adjetivo representa "uma fuga da substância" do debate e pode reforçar em eleitores de baixa escolaridade a impressão de que os progressistas os menosprezam.
Vale observar que "weird" tem um peso um pouco maior em inglês do que "esquisito" em nossa língua. Antes de ganhar o sentido mais corriqueiro de estranho, bizarro, tinha (como ainda tem) o de sobrenatural, sinistro, arrepiante.
Ainda assim, na escala das palavras ofensivas, "weird" fica um ou dois degraus abaixo de "creepy", o esquisito que é francamente assustador, que dá medo.
Que Donald Trump é um sujeito esquisito, esquisitíssimo, me parece impossível negar. O fato é que os extremistas de direita no mundo todo —Jair Bolsonaro entre eles— vêm há anos se beneficiando da imagem de palhaços sinistros. Metade do eleitorado parece gostar disso.
Se apontar a pura esquisitice desses caras, como parece ser o estilo da risonha Kamala Harris, vai dar mais certo do que a tática de declará-los inimigos da democracia, como fazia Joe Biden, a campanha dirá.
Na coluna da semana passada mencionei a nova gíria "tankar", mas faltou dizer o que ela significa. Tankar é aguentar, suportar, uma palavra nascida na linguagem dos games. Vem de "tank", o personagem fortão que aguenta porrada e bomba.
Não, ninguém precisa gostar dela. Eu nunca a usei e acho bem difícil que algum dia venha a usar. Fatos da língua têm o hábito de dispensar nossa simpatia.
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